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Artigo de Opinião

29/09/2023 08:00

Trazia um pequeno saco na mão. Caminhava descontraído e, não estivesse a ser uns dos principais atores da corrida à liderança do PSD, que decorria nessa altura, aliado ao facto de ter sido presidente da câmara durante 19 anos, poder-se-ia dizer que passava (quase) incógnito. Não tenho capacidades de vidência, mas lembro-me de me ter virado para a minha mulher e dito: " viste quem vai ali? Daqui por alguns meses será presidente do governo regional, e já será mais difícil fazer tranquilamente compras de fim de tarde sem ter pessoas a abordá-lo, pedindo algo, querendo lhe expressar alguma coisa". Não sou de reescrever a história. Nessa altura apoiava outra candidatura, que também considerava imperioso abrir novos ciclos, dentro e fora do partido, e que com toda a naturalidade colocou-se a seu lado para a previsível segunda volta. Muitos, nessa altura, na Madeira e no continente, prognosticavam-lhe uma liderança de transição. É sempre assim, após um líder carismático, líder durante décadas. Eu estudei nos mesmos livros, mas sempre achei que dar-lhe um prazo de validade política tipo iogurte era "manifestamente exagerado", como as noticias da morte de Mark Twain. Miguel Albuquerque já tinha sobrevivido a muito, nessa altura, para dar por perdida a "guerra " ao fim da primeira batalha. A reeleição há 4 anos, feita sob condições dificílimas, perante uma enorme campanha de desinformação, com o empenho de recursos aparentemente ilimitados por parte do PS e do Governo Nacional, com as mais caras agências de comunicação política e comunicação social à mistura. Essa vitória, e garantia de um segundo mandato, começaram a desmentir esses académicos, travestidos de profetas da desgraça. Mas foi nas autárquicas seguintes que Miguel Albuquerque mostrou que é o melhor político do seu tempo, utilizando a arma que distingue os bons dos maus políticos. Para vos enquadrar de que qualidade política estou a falar, vou lembrar uma entrevista dada por Mário Soares há cerca de 50 anos, na génese do PS, quando lhe perguntaram a razão por ter sido ele o escolhido para liderar os socialistas, tendo sido preteridos alguns dos maiores intelectuais do país. Soares respondeu singularmente: "porque eu tenho coragem política". E foi isso mesmo que Miguel Albuquerque demonstrou, ao escolher o seu vice-presidente, Pedro Calado, para candidato à fundamental Camara do Funchal em 2021. Ao fazer um "all in", Albuquerque colocou-se entre dois cenários: ou perdia, colocando-se a si e ao seu partido num plano inclinado do qual dificilmente sairia; ou ganhava, e voltava a colocar o PSD na condição de única solução governativa para a Madeira.

E é precisamente esta situação que as eleições de domingo vieram sublinhar. Só existe governo na Madeira, nos próximos anos, com o PSD. Um punhado de pequenos partidos, e um médio partido em processo de autodestruição, que ficou a menos de metade dos deputados e dos votos da força hegemónica, ainda mais completamente heterogéneos em termos ideológicos (quando o têm) não são alternativa a nada. Portanto, é completamente ridícula a estridência dos últimos dias relativamente à arquitetura de maioria parlamentar que garantirá a tão necessária estabilidade política. Qual era a outra opção? O Caos?

Sabemos que é importante para Costa que não se fale da derrota humilhante que o PS sofreu na Madeira. Há, inclusive, uma nuvem de silêncio face ao futuro da liderança (a formal e a de facto) daquele partido. Mas isso é algo que os socialistas, queiram ou não abafar, vão ter de resolver. Até a bem da saúde democrática regional, que necessita de oposições bem preparadas, com dimensão técnica intelectual e política. E o que perspetivamos não é grande cenário. Já não falo de Ventura, a única figura a falar nas últimas semanas, antes e após a eleição, por parte do partido de extrema direita Chega, perante o absoluto mutismo dos seus candidatos, agora eleitos. Irá mudar-se metade da semana para a Madeira, fazendo de ventríloquo dos seus deputados?

E que dizer do partido da "bilha de gás", que perante o esgotamento generalizado do tema ferry, agarrou-se com unha, e dentes ao preço da garrafa de butano, como se não existisse uma progressiva transferência para o gás canalizado e, principalmente, para os fogões-placa de indução, e termoacumuladores. A despesa na região, por alojamento de gás de garrafa e canalizado já são hoje em dia semelhantes e três vezes menos que a despesa de eletricidade. De uma coisa têm mérito: como construir um grande problema onde este não existe.

Não tenho dúvida que no atual desenho parlamentar, Miguel Albuquerque saberá encontrar os equilíbrios que possibilitarão mais uma legislatura tranquila e empreendedora, à semelhança da que agora termina. Depois de terem caído alguns dos seus contemporâneos "Compagnons de route" ele é, como o próprio admite, o mais antigo político em atividade. Sem qualquer dúvidas, um sobrevivente!

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