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Artigo de Opinião

HISTÓRIAS DA MINHA HISTÓRIA

15/09/2023 08:00

Na linha da evolução, desconhecemos qual terá sido a primeira vez em que dois seres humanos se beijaram, com que intuito o fizeram ou que tipo de relação haveria entre eles. Porém, sabemos que o ato se popularizou com significados múltiplos, variáveis de cultura para cultura e de época para época.

Para nós, o beijo social entre amigos e conhecidos tornou-se trivial. Saudamo-nos com um, ou dois beijos na face, que, na verdade, são apenas menções de beijos, já que nos limitamos a encostar bochecha com bochecha e se, há alguns anos, esse cumprimento era trocado apenas entre mulheres, hoje também o fazemos com indivíduos do sexo masculino. Entre dois homens a preferência vai para o aperto de mão, a menos que os ligue uma proximidade de parentesco.

Nem sempre assim foi e basta espiarmos os testemunhos que a literatura nos deixou, para nos depararmos com vários cambiantes do ósculo social. A Bíblia, por exemplo, diz-nos que Judas saudou Jesus com um beijo, naturalmente porque, no seu meio, ou no meio do escriba que registou o episódio, essa seria uma fórmula de cortesia comum.

O beijo entre homens manter-se-ia durante a idade média. Por exemplo, na versão ibérica do popular romance de cavalaria "A Demanda do santo Graal" (séc. XIII), são constantes os episódios em que os guerreiros se digladiam com ferocidade extrema, brandindo espadas, clavas e lanças. Por fim, feridos, quase sempre à beira da morte, encomendam-se a Deus e, sem rebuço, choram de forma ruidosa, abraçam-se e beijam-se, unindo as bocas ensanguentas e cheias de pó, numa demonstração do expoente máximo de companheirismo.

Por este tempo era também comum beijar a mão ou mesmo os pés dos mais poderosos, como sinal de respeito, submissão ou vassalagem. Uma prática, cujos resquícios subsistiam até um tempo, não muito distante, em que se pedia a bênção aos pais, avós e padrinhos, que respondiam com um "Deus te abençoe" e estendiam a costa da mão para que a beijássemos.

O Romantismo veio sublinhar o pudor do amor e o recato da paixão, introduzindo as subtilezas do respeitoso beijo na testa ou do galanteador beijo na mão da dama, acompanhado pela intensidade do olhar a falar o que as palavras calam. O beijo nos lábios ou na boca, como reduto de intimidade e entrega voluntária, estava, e creio ainda estar, reservado aos amantes.

Não podia deixar de fora a literatura infantil e aqueles que serão, por ventura, os seus dois beijos mais inesquecíveis: o do príncipe à Bela Adormecida e o da princesa ao sapo que se transforma em príncipe — ambos salvíficos e embrulhados em aura de amor romântico. Claro que o ato da princesa foi mais exigente já que implicou ultrapassar o asco de beijar o sapo, enquanto o príncipe agiu deslumbrado pela beleza da jovem adormecida.

A verdade é que estes ideais persistem no nosso imaginário social. A mulher quer-se bela e recetiva e existem muitos sapos que se sentem no direito de beijar qualquer princesa, mesmo que desprevenida. Por outro lado, também há muitas princesas a acreditar que o seu beijo poderá converter qualquer sapo num príncipe maravilhoso.

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