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Artigo de Opinião

24/11/2025 07:40

Cristiano Ronaldo voltou a fazer aquilo que sempre faz: pôs o planeta inteiro a falar dele. Não precisou de marcar um golo de bicicleta, nem de levantar mais um troféu; bastou aparecer na Casa Branca, ao lado de Donald Trump e na comitiva de Mohammed bin Salman, para incendiar os cafés, as tertúlias televisivas e toda a fauna digital do costume. O país dividiu-se com a velocidade de um livro de reclamações em plena Black Friday: de um lado, quem acha que Ronaldo é livre, adulto e soberano nas suas escolhas; do outro, quem viu nele o embaixador involuntário de regimes e figuras que dispensam apresentações e não necessariamente pelas melhores razões.

Convém começar pelo óbvio: Cristiano Ronaldo não é diplomata, estadista, ministro, nem sequer aspirante a moralista de ocasião. É, sim, o maior símbolo de sucesso português desde que decidimos trocar caravelas por aviões, e a prova viva de que talento sem trabalho vale pouco, mas trabalho com disciplina vale tudo. CR7 teve tudo para dar errado — pobreza, contexto, fragilidade familiar — e, ainda assim, construiu uma carreira que tocou o inalcançável. Isto não desaparece porque tirou uma fotografia ao lado de Trump. Não se apaga porque entrou num jantar onde circulam interesses, agendas e egos de escala global. A biografia supera a polémica do dia.

Mas também é inegável que, quando se é a pessoa mais seguida do mundo, a neutralidade tornou-se um luxo que já não se possui. Ronaldo pode não querer ser político, mas é impossível não ser político quando se senta numa mesa onde cada gesto tem significado e cada silêncio tem peso. É aqui que entra a crítica, legítima, mesmo quando exagerada, de quem vê aquela imagem como um subsídio de legitimidade a líderes altamente controversos. Para uns, é ingenuidade. Para outros, é cálculo. Para muitos, é simplesmente desconfortável.

A outra parte da história é a nossa: Portugal continua com dificuldade em lidar com a escala de Cristiano Ronaldo. Há quem o idolatre como um semideus pagão, pronto a defender tudo o que faz; e há quem aproveite cada oportunidade para o rebaixar, nem que seja para se sentir moralmente superior durante trinta segundos. O problema está em ambos os extremos. Quando colocamos pessoas em pedestais sagrados, deixamos de vê-las como humanos, e essa cegueira faz mal tanto ao ídolo como ao público. Ronaldo é o melhor exemplo de que o talento é extraordinário, mas as pessoas são normais: cheias de virtudes, contradições, decisões acertadas e outras que merecem escrutínio.

E sim, há uma crítica válida quando se questiona a associação simbólica entre Ronaldo, MBS e Trump. Não porque Cristiano tenha passado a patrocinar violações de direitos humanos — essa acusação é absurda — mas porque a sua simples presença naquele cenário confere glamour a um palco que, eticamente, é tudo menos glamouroso. É a velha história: quem tem luz própria ilumina tudo onde pisa, incluindo sombras que talvez preferisse não destacar.

Mas também há lucidez quando se percebe que Ronaldo não é o responsável pela política saudita, nem pelo temperamento explosivo de Trump, nem pelos negociadores de armamento e outros entes que orbitam essas cimeiras. É, no fundo, mais uma peça num jogo gigantesco, onde os poderosos gostam de exibir troféus vivos, e o maior símbolo global do futebol é, inevitavelmente, um deles.

Entre o moralismo chato e o endeusamento acrítico, sobra o único lugar sensato: a noção de que Ronaldo é uma figura humana com impacto sobre-humano. Que tem o direito de fazer escolhas discutíveis. Que merece crítica quando erra e reconhecimento quando acerta. E que continua a ser, goste-se ou não, o maior exemplo de que o sucesso não nasce do berço, nasce da persistência, daquela obstinada, quase teimosa, que nos lembra que não há atalhos para o topo.

Se o mundo está ao contrário por ter Trump e Ronaldo no mesmo enquadramento? Talvez. Ou talvez o mundo esteja apenas a ser o que sempre foi: complexo, imperfeito, contraditório. E, no meio desse caos, Cristiano continua a ser aquilo que sempre foi — um fenómeno que ultrapassa explicações simples e que, quer se queira quer não, obriga-nos a olhar para as nossas próprias certezas com um pouco menos de conforto.

A saída de Vítor Matos revela a crueza do mercado. O Swansea pagou a cláusula de um milhão de euros, um valor gigantesco para a II Liga, e o treinador quis ir. Ponto final. Não há gestão que resista quando um clube inglês aparece com dinheiro na mão e um treinador ambicioso vê diante de si uma oferta irrecusável. É um golpe duro, sem dúvida, naquilo que estava a ser o caminho traçado para o eventual regresso do Marítimo à Primeira Liga. A transição de pasta que se seguirá nos próximos dias será determinante para o futuro próximo do nosso clube. Faço votos de que a direção acerte novamente, tal como acertou com Vítor Matos.

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