A professora de São Vicente que, em 2021 foi vítima de intimidações por cartas anónimas e que teve um engenho explosivo colocado no seu carro, em abril do ano seguinte, foi hoje ouvida em tribunal, tendo sido a primeira testemunha do processo que tem um fiscal municipal como único arguido, neste caso, acusado de ser o autor da colocação do artefacto na viatura da docente. O arguido não esteve no tribunal, por estar de baixa psiquiátrica, como foi explicado no início da sessão.
Patrícia Oliveira, também assistente no processo, contou ao coletivo de juízes presidido por Teresa de Sousa que as cartas anónimas com ameaças começaram a lhe ser enviadas em fevereiro de 2021 (situação que durou até abril de 2022), numa altura em que mantinha uma relação amorosa assumida publicamente com o então presidente da autarquia, José António Garcês, que se encontrava divorciado. Aliás, o próprio é uma das testemunhas arroladas, mas o Juízo Central Criminal terá de requerer autorização à Assembleia Legislativa da Madeira para que o agora deputado seja autorizado a testemunhar. Aliás, Garcês nem chegou a comparecer hoje no edifício 2000.
A primeira, de três testemunhas ouvidas esta manhã, contou o que passou com as ameaças por cartas anónimas, cujos processos estão arquivados, mas que deixaram marcas psicológicas, disse. Desde essa altura toma medicação para dormir e ainda hoje é seguida por um psiquiatra e por um psicólogo.
No caso do engenho explosivo encontrado, a 9 de abril de 2022, na sua viatura, estacionada na quinta da casa onde vivia, foram deixados no local objetos nos quais foram detetadas impressões digitais e o ADN do arguido, Francisco Faria. Em concreto, durante a madrugada desse dia, quem colocou o artefacto no carro terá fugido à pressa, depois de ter sido acesa uma luz no interior da casa (pelo proprietário). A dona do carro, estacionado a menos de dois metros da parede do quarto desta, estava a dormir, já “vivia medicada”.
A testemunha e vítima do caso entende que as cartas anónimas e o engenho colocado no seu carro não estão dissociadas. Contou, aliás, que alguém já teria deixado decapante no capô do seu carro e espuma expansiva no cano de escape, sendo que neste último caso, foi quando o seu carro estava estacionado junto à escola, com a circunstância de o carro de trabalho do arguido estar parado na mesma zona.
sublinhou que só conhecia o arguido de vista, nunca terá falado com ele e que associa a tentativa de bomba ao seu carro às cartas anónimas com ameaças que recebia, por estar num relacionamento com o ex-autarca, que era referido nessas missivas. Era ofendida e classificada de “prostituta” e “vagabunda” nesses textos escritos por computador, para além de ter recebido, em algumas cartas, uma bala, uma para e cabeça de galinha.
A testemunha era também alvo de intimidação pelas redes sociais, tendo sido referida a página ‘Fame Portugal’, na qual esta era “enxovalhada”, com textos em “nome da moral e dos bons costumes” e nos quais a ex-mulher de Garcês era adjetivada como “a primeira-dama de São Vicente”.
Dos seus relatos, contou que recebeu, na escola que dirige, uma carta alegadamente do arguido no qual este solicitava uma reunião com a testemunha, alegando que seria do seu interesse já que, para além de fiscal da Camara, “geria um estabelecimento de diversão noturna”.
Na sequência das ameaças que já vinha a receber – bem como o senhorio Renato S, como este viria a relatar em tribunal, como testemunha – foi colocado um sistema de videovigilância no exterior da casa. Ora, as imagens mostram um indivíduo no local, à volta do carro, e depois a fugir, mas não é possível reconhecer a identidade da pessoa.
Na lista de testemunhas, está também a ex-mulher de Garcês (na altura dos factos), que não foi ouvida hoje. A título de curiosidade, e que suscitou até estranheza por parte do coletivo, foi o facto de o advogado desta ter assistido a esta sessão.
Estes alguns dos momentos da manhã de julgamento que tem novas sessões agendadas para o dia 14 de janeiro e para o dia 14 de abril. Faltam ser ouvidas dez testemunhas por parte da Defesa e da Acusação.