As eleições autárquicas passadas confirmaram o que já se previa, o país virou em definitivo à direita, deixando de haver espaço político para que a esquerda consiga defender as suas causas. Foi a escolha dos eleitores e há que respeitar.
Mas essas escolhas têm as suas consequências e terão de ser esses mesmos eleitores a aceitarem as mudanças que a maioria de direita irá impor.
Uma das áreas onde existem grandes diferenças entre a esquerda e a direita, é precisamente na área do trabalho e à forma como a relação patrão/empregado deve existir.
A esquerda sempre foi mais protetora dos trabalhadores, enquanto a direita prefere privilegiar os direitos dos patrões. Essa diferença é muito clara na reforma da lei laboral apresentada pelo governo e que este apelidou de melhoria da competitividade e da produtividade.
A mim, que sempre tive um pensamento de esquerda, causa-me impressão a leveza, e diria quase leviandade, com que o governo se prepara para cortar tantos e tantos direitos que os trabalhadores lutaram durante anos para conquistar. E apesar do título pomposo que deram a esta reforma laboral, em nada irá contribuir para a melhoria da competitividade do país e da sua produtividade.
Vejamos alguns exemplos:
Os contratos a termo, antes limitados a 2 anos, com um limite de renovações até 4 anos, passam a poder ir até aos 3 anos por contrato e 5 anos no limite, ou seja, prolonga-se a precariedade no tempo. Antes as grandes empresas não podiam recorrer a este tipo de contratos, agora podem e os contratos de muito curta duração (até 35 dias) que estavam limitados a setores óbvios como a agricultura e turismo, passam a poder ser utilizados por todos os setores de atividade. Precariedade algo que a direita adora.
Recuperam o banco de horas, podendo exigir aos trabalhadores trabalharem mais 2h por dia e os trabalhadores com filhos até 12 anos estavam protegidos no que diz respeito à flexibilização do horário de trabalho, com esta proposta, perdem esta proteção tão importante para a assistência à família. Também a formação obrigatória passa das 40 horas anuais para 20 horas, diminuindo assim a capacitação dos trabalhadores.
No que diz respeito aos despedimentos, os trabalhadores ficam muito mais desprotegidos, pois o Ministério Público deixa de ter qualquer papel nestes processos, obrigando os trabalhadores a recorrerem a advogados e ao pagamento de taxas de justiça, o que para muitos trabalhadores é o suficiente para não conseguirem fazer a sua defesa, e quando um trabalhador ganha em tribunal um processo de despedimento, a empresa deixa de ser obrigada a reintegrar e terá de pagar no máximo um ano de salário, mesmo que o processo se prolongue por muito mais tempo, cabendo à Segurança Social pagar o remanescente. Ou seja, compensará o despedimento, mesmo que seja considerado ilegal. A possibilidade das empresas recorrerem a outsourcing em áreas em que procederam a despedimentos, é mais um passo atrás nos direitos dos trabalhadores.
Os serviços mínimos em caso de greve deixam de ser apenas para setores essenciais, podendo alegar questões meramente económicas para recorrerem a estes procedimentos. Com isto, a greve perde muita força e consequentemente a luta dos trabalhadores por melhores condições de trabalho também.
De modo a contrariar a perceção de salários baixos, o governo propõe novamente que o subsídio de férias e de natal sejam pagos em duodécimos criando a sensação de aumentos salariais.
A descriminalização do trabalho não declarado é também um grande revés nos direitos dos trabalhadores, permitindo que os patrões deixem de fazer os descontos para a Segurança Social, pagando apenas uma multa.
É por isto que 12 anos depois o país volta a ter uma greve geral. Sim, porque o governo é de direita, porque esta direita retira direitos que tanto custaram a conquistar.