Na V Conferência do Caminho Real da Madeira, Renato Goulart, guia de montanha açoriano com mais de 3 mil subidas ao Pico e 30 anos de experiência, partilhou uma reflexão profunda sobre a segurança, o equilíbrio territorial e o impacto do turismo nas áreas naturais. Com 52 anos, falou tanto “como guia quanto como ser humano”, chamando a atenção para o risco de o turismo em excesso “vos ameaçar tirar o vosso quintal”.
Goulart descreveu a montanha como um espaço que exige resiliência, determinação e consciência dos próprios limites. Para si, subir uma montanha é um processo que vai muito além de alcançar o cume: “Quando não conseguimos chegar ao topo, é porque o objetivo foi definido de forma errada. É recuar e tentar todas as vezes que forem necessárias.” Sublinhou ainda que “as montanhas medem-se quando chegamos cá abaixo”, lembrando que a experiência só se concretiza quando o percurso é concluído em segurança. “A montanha não perdoa”, reforçou. “É preciso fazer o trabalho bem feito, equipar-nos corretamente e perceber se estamos preparados.”
O guia lembrou que fazer percursos pedestres “não é apenas caminhar”, mas também conhecer a envolvência do trilho, a sua história e a sua identidade.
Defendeu que deixar pegadas, no sentido de uma presença consciente e responsável, é “a melhor coisa que podemos fazer na natureza”.
Apesar disso, alertou que a montanha “não dá acesso a toda a gente”, e que essa noção deve ser interiorizada, sobretudo num destino com um turismo muito mais intenso do que o dos Açores. “Eu falo pela realidade local açoriana, que não tem nada a ver com o turismo enorme que se vive na Madeira”, observou.
Renato Goulart defendeu que a Região precisa de reforçar a monitorização dos trilhos, chamando a atenção para os acidentes mortais que ocorrem todos os anos nos percursos madeirenses. “Aqui, na Madeira, vocês têm acidentes mortais. Quando nos impõem regras, temos de as respeitar”, afirmou, numa defesa clara de normas mais rigorosas e de uma cultura de prevenção.
A intervenção de Goulart integrou o primeiro painel da conferência, “Território e Pressão”, que contou também com a participação de Dinarte Fernandes, presidente da Câmara Municipal de Santana, e de Élvio Camacho, investigador da Universidade da Madeira nas áreas da sustentabilidade turística e da capacidade de carga.