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Artigo de Opinião

13/05/2021 08:03

À adolescência associamos o desejo/urgência de interação, de "estar junto", a necessidade de pertença, afiliação e excitação. É uma fase de procura da identidade em que o grupo se afirma como a principal influência, deixando para segundo plano os pais /mães, anteriormente vistos como "donos da verdade". Uma fase pouco compatível com a "reclusão", com os limites impostos pela pandemia, reconhecidos como protetores, mas sentidos como obstáculo às vivências normais e expectáveis. Para muitos adolescentes o confinamento, a suspensão da prática desportiva/artística, o ensino não presencial e a impossibilidade ou restrição no convívio informal com os outros, traduziu-se em manifestações de mal-estar e mesmo de sofrimento psicológico.

O desejo de voltar às rotinas pré-pandemia, ao quotidiano feito de várias atividades em que o tempo de "pausa" era limitado, era partilhado por muitos. O isolamento social, amenizado pelo contacto online (não desprovido de riscos), desencadeou em muitos tensão, cólera, ansiedade, angústia, desmotivação escolar ou uma apatia geral.

A zanga, frustração ou tristeza pelo adiar das experiências, a paragem imposta pela pandemia e a incerteza associada eram partilhadas, mas também vividas em solitário. Por isso, e numa altura em que se concretiza o desejado desconfinamento, seria espectável pensar que os adolescentes estão felizes, entusiasmados, aliviados. Sim, mas não todos. Para muitos o regresso à vida pré-pandemia, é fonte de stress e não de alívio. De angústia e não de entusiasmo. De tristeza e não de alegria.

Quando o regresso não é para celebrar, quando o voltar a estar no ambiente natural na escola não é vivido com entusiasmo, mas com apreensão, quando miúdos nos olham e dizem "na sala não podemos silenciar o outro", e assim "tirar o som", não ouvindo os comentários, difíceis de ignorar, importa parar e pensar.

Quando nos dizem "é bom, mas não há tempo, temos de pensar nos exames", soltando um suspiro enquanto falam das aulas, das explicações, dos testes, dos exames, importa parar para pensar. Onde fica a espontaneidade, a alegria, o entusiasmo, o "ser adolescente"?

Onde fica o tempo para "apenas estar" com os amigos? Para "falar de tudo ou de nada"? Olhando à volta, escutando e observando, é frequente ouvirmos a palavra "stress", "ansiedade", "medo", que remetem para estados emocionais mais associados a determinadas fases da vida adulta, pessoal ou profissional.

Hoje, fechando os olhos, e centrando-nos nas palavras ditas, ouvimos adolescentes verbalizar a preocupação com as notas, num quotidiano em que o foco é o sucesso medido por números, pelo que se alcança, pelo resultado, por conseguir ficar em primeiro, hoje, mas também amanhã. A exigência, sentida por muitos, imposta (por vezes inconscientemente) pelos adultos, traduz-se num quotidiano vivido em "excesso de velocidade", sem paragens para "reabastecer", com horários para tudo, até para relaxar. Muito se fala do "ano perdido" pela pandemia, mas pouco se fala dos "momentos perdidos" pela pressão do sucesso, que transforma a existência e o "valor" do João ou da Ana nos resultados académicos obtidos. Sim, são importantes, mas não são tudo. A valorização e realização pessoal não se podem centrar no sucesso académico, têm de incluir o bem-estar psicológico, o sentir-se cuidado, protegido, aceite, valorizado. Cuidado pelos outros e por si (o desfrutar de uma atividade ou de um tempo de lazer). Protegido e aceite, pelos outros e por si, num reconhecimento das suas forças e fragilidades, numa avaliação e aceitação clara de que há expetativas que são irrealistas, que "um mês de caminhadas não me habilita a subir aos Himalaias". Valorizado, pelo que é, independentemente de estar no "quadro de honra" da escola. Não interpretem mal, todos procuramos o sucesso, mas o autoconceito, a resposta à questão "quem sou eu?”, não se pode limitar ao desempenho académico, tornando o adolescente um vencedor ou um fracasso em função do resultado e da pauta.

Juntamente com a palavra pandemia, outras entraram no nosso vocabulário. Saúde psicológica e resiliência são dois exemplos. Ambas alertam para a importância de olhar para além da superfície, de dar atenção ao "sentir", ao "pensar", ao que está "submerso", ao que se esconde por detrás do desempenho, do comportamento, da ação.

Qual a atenção que damos enquanto sociedade aos sinais que os adolescentes nos dão? Encaramos a ansiedade e o stress como fraqueza, vulnerabilidade, falta de competências, uma falha pessoal (que se interioriza), respondendo a correr, "tens de aprender a lidar com isso", sem tempo para responder à segunda questão "sim, eu sei, mas como, ensinas?"

Importa parar para pensar e responder...

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