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Artigo de Opinião

Psiquiatra

23/01/2024 08:00

Dito de uma forma simples, a comunicação na sociedade em geral está nas “horas da morte”. Parece que o bom-senso foi expulso do palco e agora só temos comunicação para chamar a atenção do maior número de seguidores, subscritores ou eleitores. Vejam o caso das notícias da semana passada. Sai a notícia de que num ano o SESARAM perdeu quatro psiquiatras. Qual é a solução para este problema? Vem a Secretaria da Saúde dizer que vai abrir concurso para contratar psiquiatras. Mas afinal isto faz algum sentido? Os psiquiatras que saíram enganaram-se nos papeis e em vez do papel de férias assinaram o da rescisão? E é preciso um novo concurso para eles entrarem novamente? Ou então, vamos apelar ao bom-senso e tentar perceber que a solução para estes problemas não será “vamos abrir concurso”, quando o problema está relacionado com a fixação e não com a captação.

Recentemente uma senhora relembrou-me a importância do Cliente Mistério e sugeriu que deveria aplicar-se à saúde este conceito da gestão tão profusamente utilizado. Admito que nunca tinha pensado sobre isso, mas faz sentido. Afinal, para quem não sabe, a maior parte das auditorias e selos de qualidade que as instituições de saúde recebem, são sobretudo se os papeis estão em ordem, não com os resultados da sua atuação.

Afinal, talvez o que se passe na psiquiatria do SESARAM seja algo parecido ao que se passa na política. Apesar da ciência e da boa prática médica apontar para uma direção, se for conveniente para o grupo ir noutra, é nessa direção que se vai. Afinal, a Secretaria da Saúde continua a deixar que os doentes com subsistemas paguem o seu internamento psiquiátrico que deveria ser hospitalar e gratuito.

O problema da comunicação é também um problema das políticas em saúde. A exaustão com que os profissionais de saúde do SESARAM se encontram, que existe por tantos motivos, faz com que pareçam pessoas malformadas e maus profissionais, quando na verdade não o são. Por exemplo, há poucos dias tive de ouvir que “a pessoa não vai receber mais sangue porque o sangue esgotou”, quando não era verdade. Tive de ligar diretamente para o banco de sangue a oferecer sangue e afinal o colega esclareceu-me e bem, que não era essa a razão, mas sim uma decisão de boa prática médica. Qual seria a angústia dos familiares que não pudessem fazer esta chamada?

O problema principal entre muitos familiares e os profissionais de saúde, é a comunicação. Afinal não estamos todos para o mesmo? Não queremos todos fazer o melhor pelas pessoas que temos à nossa frente? Mas para isso acontecer, temos de falar a verdade e temos de o fazer de forma adequada. As famílias terem informações atualizadas diariamente sobre o seu familiar, não devia ser uma caça ao tesouro, devia ser tratamento padrão. Nos casos mais difíceis e em todos os serviços, devia-se implementar o que os cuidados paliativos conhecem como conferências familiares. Afinal, sabe-se que existem boas e más formas de comunicar em saúde. E há muito para melhorar.

Existem muitas razões para a exaustão dos profissionais de saúde e muitas delas não são pelo excesso de trabalho, nem pelo ordenado, apesar destas serem razões importantes. É intolerável lidar diariamente com o sofrimento humano e com os problemas do sistema. Penso que chegou a altura de as pessoas endireitarem a coluna, deixarem de olhar para o chão e lutarem. Eu sei que não tolero o que vejo e falo, com as devidas consequências. Mas se todos falarmos, não vamos ser todos convidados a sair.

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