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Artigo de Opinião

18/12/2025 08:00

O Natal é frequentemente apresentado como tempo de encontro. De mesas cheias. De vozes cruzadas. Mas, paradoxalmente, é também uma das épocas em que a solidão mais dói. Pessoas rodeadas de luzes, mas internamente às escuras. A solidão não é apenas ausência de companhia. É a perceção dolorosa de não se sentir ligado a ninguém.

A ciência confirma o que a experiência clínica revela. A solidão crónica tem um impacto profundo na saúde mental e física. Estudos de Julianne Holt-Lunstad, da Universidade Brigham Young, mostram que o isolamento social aumenta o risco de mortalidade precoce de forma comparável ao tabagismo ou à obesidade. Não é apenas tristeza. É risco real. É sofrimento mensurável.

O ser humano é, por natureza, relacional. O nosso cérebro desenvolveu-se em grupo. As emoções regulam-se na presença do outro. A dor emocional ativa os mesmos circuitos da dor física. Isto não é poesia. É neurociência. Quando somos excluídos ou ignorados, o corpo reage como se estivesse ameaçado.

Nesta época de Natal, as relações familiares ganham um peso particular. Não porque sejam sempre fáceis, mas porque são estruturantes. Relações familiares seguras funcionam como um amortecedor emocional. A investigação em psicologia do desenvolvimento mostra que vínculos estáveis ao longo da vida aumentam a resiliência e diminuem o risco de depressão. Não se trata de famílias perfeitas. Trata-se de presença. De disponibilidade emocional. De pequenas reparações.

As amizades têm um papel igualmente vital. Estudos longitudinais, como o Harvard Study of Adult Development, demonstram que relações de amizade próximas são um dos melhores preditores de felicidade e saúde ao longo da vida. Mais do que sucesso profissional ou estatuto social. Amigos são espelhos. São testemunhas da nossa existência. Validam-nos.

Mas nem todos têm família próxima ou amigos disponíveis. É aqui que a comunidade se torna essencial. Sentir que pertencemos a algo maior do que nós próprios protege-nos psicologicamente. Iniciativas comunitárias, voluntariado, redes de vizinhança e associações de cariz local reduzem comprovadamente sentimentos de solidão e aumentam o sentido de propósito. Ajudar também cura.

Combater a solidão não é apenas uma responsabilidade individual. É um compromisso coletivo. Este combate requer políticas públicas, mas também gestos simples. Um convite. Uma mensagem. Um lugar à mesa. Pequenos atos têm impacto profundo. O humanismo chama a tudo isto humanidade.

O Natal lembra-nos algo essencial. Não somos feitos para atravessar a vida sozinhos e a dignidade humana constrói-se na relação. Quando combatemos a solidão, não estamos apenas a aliviar sofrimento, mas também estamos a afirmar o valor do outro. E, nesse gesto, reafirmamos o nosso próprio valor.

Num mundo cada vez mais conectado digitalmente, mas emocionalmente fragmentado, escolher estar presente é um ato profundamente humano. E talvez seja esse o verdadeiro espírito do Natal.

OPINIÃO EM DESTAQUE
Coordenadora do Centro de Estudos de Bioética – Pólo Madeira
18/12/2025 08:00

Há uma dor estranha, quase impossível de explicar, que nasce quando alguém que amamos continua aqui... mas, aos poucos, deixa de estar. Não há funerais,...

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