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Artigo de Opinião

silviamariamata@gmail.com

11/04/2021 08:00

Ilusões! Que saudades dessas vozes, desses cheiros, desses sabores! Era Domingo. Cheirava a Domingo. Ouvia-se Domingo! Sabia a Domingo! Sentia-se Domingo!

Depois do almoço. Partimos. A pé, já se sabe! E pelo caminho, meu pai assobiava baixinho e encantava-se com tudo, com a música dos pássaros, com uma pedra que ainda estava ali desde que ele tinha a minha idade; com o tronco descaído daquela árvore onde ele se sentara a gozar a sombra; com aquela flor que havia de nascer logo acolá naquele bardo!

Chegámos. Lá está o avô ao balcão. Tem a telefonia ao ouvido. Pedimos a bênção um a um. Deus Nosso Senhor te abençoe! E não fala mais!

Os primos, os mais novos, ficavam felizes com a nossa chegada. Olhos de luz! Cabritinhos à solta! E um deles, que grande novidade e alegria, recebera de presente da tia da América, um rádio e um microfone, uma maquineta sofisticada para a altura. E fazia-nos entrevistas, à moda de um jornalista. E depois exibia a gravação!

E a avó recebia-nos no terreiro de braços abertos a rir muito e a limpar as mãos ao avental! Lá estavam as primas todas e os primos e as tias e os tios. Já lá estava o tio que era nosso vizinho e as primas! Éramos sempre os últimos a caminhar de casa! Minha mãe era uma encrenca! Inventava sempre coisas para fazer à última da hora! E aquilo era tanta gente, tudo no terreiro da avó que cheirava a pão de casa e a bolo do caco quente acabado de fazer!

E recordo as ovelhas no curral do avô, as galinhas esgravatando à solta nos poios; as ameixas; as peras e os peros, as castanhas, os araçais! E sei o lugar onde cada árvore nascia e sei o cheiro e sei a macieza e a acidez do gosto e sei o porte altivo de cada uma.

E mais sei e desenterro de dentro de mim a música das vozes, rindo e contando histórias preguiçosas de domingo, o meu encanto, porque eram histórias de verdade! E eu ria deliciada sem perceber onde morava dentro de mim aquela paixão do gostar daquelas inutilidades.

E à noitinha, na quentura da roda da mesa, bebíamos ávidos uma canja como nunca mais encontrei sabor em lado nenhum. O sereno lá fora espreitava pelo postigo, porque havia um bafo quente de muita gente ali.

E noite cerrada, pequenas vocês que adeus, voltávamos a casa a pé felizes e contentes, mais o tio nosso vizinho, a tia e as primas. Aquilo era agora um ror de gente pelo caminho abaixo, uma folia de vozes e era tão bom! Seguíamos pisando o riozinho de luz que a Lua desenhava de propósito para a gente! Não era preciso o olho de boi! Ela, lá no alto, imponente e majestosa, fazia-nos companhia! Não é preciso ter medo! Vamos à conta de Deus Nosso Senhor!

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