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Artigo de Opinião

Coordenadora regional do Bloco de Esquerda

26/11/2021 08:01

Qualquer forma de violência é grave e deve ser combatida e denunciada, mas não deixa de ser avassalador que sejam as mulheres, independentemente da faixa etária, as principais vítimas. Neste vasto e cruel universo distorcido de razão(ões) inclui-se não só a violência física, mas também a sexual, a psicológica, a racial e étnica, o idadismo, entre diversas outras.

O nosso pequeno país, entre continente e ilhas, à beira mar plantado e de brandos costumes não fica incólume a esta triste e nefasta realidade e a pandemia veio acentuar ainda mais este flagelo, aprofundando desigualdades e duplamente oprimindo as vítimas que se viram fechadas em casa, durante os períodos de confinamento, e por isso totalmente à mercê do opressor.

É um facto que a grande maioria dos actos de violência doméstica e sexual acontece no seio familiar, o que torna o problema incompreensível, do ponto de vista das relações e dos elos que nos unem àqueles que nos deviam proteger e amar (porventura os psicólogos terão uma opinião clínica distinta), e de complexa resolução do ponto de vista formal.

Perante isto, a exigência e a pressão da vítima sobre si mesma, quando confrontada com a necessidade básica de denunciar o agressor, é, certamente, tremenda, e, talvez por isso, será muitas vezes inibidora dessa denúncia. Ao que acresce a pressão social e económica, mesmo quando a realidade revela que esta violência é transversal a todas as classes sociais.

Daí a enorme importância de o crime de violência doméstica ter sido tornado público. Passámos nós, também enquanto comunidade, compelidos a agir e a não ficarmos indiferentes perante os casos flagrantes a que possamos assistir ou vivenciar. A responsabilidade de denunciar também é nossa.

É assim de vital relevância a implementação de políticas públicas que protejam as vítimas (finalmente @s filh@s viram reconhecido esse estatuto, plasmado na Lei 57/2021), que lhes assegurem a possibilidade de se reconstruir e às suas vidas e que, de facto, punam o agressor.

Infelizmente, isso tantas vezes não acontece. Quando é a vítima obrigada a deixar a sua casa para fugir e refugiar-se com os filhos num qualquer outro local. Quando assistimos a inacreditáveis sentenças de tribunais que culpabilizam as vítimas pelas agressões, ou então que desvalorizam o seu testemunho inocentando o agressor. Ainda há tanto por fazer neste campo da justiça, dominada por executores profundamente patriarcais e conservadores.

Segundo o relatório divulgado esta semana, pela UMAR, soubemos que foram assassinadas este ano, no nosso país, e até ao momento, 23 mulheres, a maioria vítima de violência doméstica. Duas dessas vítimas são da nossa região.

Na grande maioria dos casos, essa violência era conhecida de terceiros e mesmo das autoridades. É urgente combater a desvalorização social deste crime, bem como a inércia, a ineficiência ou a burocracia dos serviços. Como é que se diz ou explica a alguém que é vítima reiterada de violência física e/ou psicológica que tem de esperar porque o caso está a ser analisado ou falta algum parecer ou tem de aguardar vaga?

Também é urgente actuar ao nível da prevenção, e aqui a educação para a cidadania tem um papel fundamental. Aos decisores políticos, sejam eles governantes ou autarcas, para além de legislarem, compete ainda a constante discussão destes temas, dando o seu contributo para a consciência colectiva em torno destas temáticas fundamentais dos Direitos Humanos.

As autarquias, devido à maior proximidade com os cidadãos, têm aqui um papel mais interventivo e preponderante.

É urgente delinear estratégias de combate à violência, mas para isso ser eficaz é necessário conhecer a realidade do nosso território, ou não passarão de medidas avulsas e ao sabor de cada um.

E porque não podemos esquecer, termino com uma singela homenagem às vítimas deste crime bárbaro: à Ana Cristina Lopes, à Ana Maria Sim-Sim, à Anabela Almeida, à Beatriz Cadinha, à Carla Sofia Pereira, à Carmo Oliveira, à Catarina Gonçalves, à Laura de Jesus, à Lígia Monteiro, à Márcia, à M. Celeste Madureira, à Maria de Deus, à M. Fernanda Vilela, à M. Helena Ribeiro, à Martine der Morche, à Olívia Correia, à Sónia, à Soraya Sousa, à Teresa Janeirinho, à Teresa Oliveira, e a três mulheres que não foram identificadas nos media com 86, 57 e 42 anos.

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