MADEIRA Meteorologia

Artigo de Opinião

Coordenadora do Centro de Estudos de Bioética – Pólo Madeira

20/11/2025 08:00

Há dores que o coração se recusa a aceitar, e a da doença de quem amamos é uma delas. No início, agarramo-nos à esperança como quem se agarra a uma tábua no meio do mar revolto. Queremos acreditar que é apenas uma fase, um esquecimento passageiro, uma distração comum. Dizemos a nós mesmos que tudo vai voltar a ser como antes, que em breve aquela pessoa vai sorrir com a mesma clareza, contar as mesmas histórias, chamar-nos pelo nome sem hesitar. Queremos crer, com todas as forças, que haverá um milagre, que a vida não pode ser tão cruel a ponto de apagar a essência de alguém em vida.

A negação instala-se como uma espécie de anestesia. Ela protege-nos da realidade dura: a de que não há cura, de que a doença caminha para a frente e não para trás, e de que cada dia rouba um pouco daquilo que conhecíamos tão bem. É mais fácil acreditar que tudo vai passar, que amanhã acordaremos e será como antes. É mais fácil sonhar do que encarar a sentença silenciosa que a vida nos impôs.

Mas o coração é teimoso. Ele insiste em procurar sinais de regresso, como se um olhar mais firme ou uma palavra solta fossem prova de que tudo está a voltar. Ficamos à espera de um gesto que nos devolva a pessoa inteira, como se o tempo pudesse dar marcha-atrás. No fundo, lutamos contra a injustiça de ver alguém condenado a perder-se de si mesmo, passo a passo, memória a memória. Perguntamo-nos como é possível: como é possível alguém estar vivo e, ao mesmo tempo, partir um pouco todos os dias?

E no meio dessa luta silenciosa, há raiva, há lágrimas escondidas, há noites em claro. Há promessas ao céu, quase súplicas: “Não deixes que seja assim... não pode acabar desta forma.” Porque dentro de nós, continua a existir a crença infantil de que o amor pode tudo, de que a nossa presença pode travar a doença, de que a vida, por compaixão, nos vai devolver quem perdemos.

Mas a verdade, tão dura e inevitável, é que a doença não devolve, apenas leva. E a negação, embora compreensível, apenas atrasa o passo que mais cedo ou mais tarde teremos de dar: o de aceitar. Não aceitar com indiferença, mas com coragem. Porque é na aceitação que nasce a força para cuidar, para estar presente, para amar sem esperar retorno, para segurar na mão que já não reconhece a nossa, e ainda assim não largar.

A negação é humana. Mas a superação dela é o que nos permite transformar dor em presença, medo em paciência, perda em amor absoluto. Porque, mesmo que a pessoa que conhecíamos já não regresse, ela ainda está aqui, de outra forma, e merece ser amada até ao último instante, com a mesma intensidade com que a amámos desde o primeiro.

OPINIÃO EM DESTAQUE

88.8 RJM Rádio Jornal da Madeira RÁDIO 88.8 RJM MADEIRA

Ligue-se às Redes RJM 88.8FM

Emissão Online

Em direto

Ouvir Agora
INQUÉRITO / SONDAGEM

Como avalia o desempenho das autoridades no combate ao tráfico de droga?

Enviar Resultados
RJM PODCASTS

Mais Lidas

Últimas