Um total de oito dos 16 arguidos do processo ‘Asclépio’, que investiga uma alegada fraude no Sistema Regional de Saúde dos Açores, vão a julgamento, segundo a decisão instrutória conhecida hoje.
Em abril de 2024, o Ministério Público deduziu acusação contra 16 arguidos, imputando-lhes 55 crimes, incluindo corrupção ativa e passiva e associação criminosa, envolvendo o Serviço Regional de Saúde.
Em causa está um alegado esquema em que “os principais arguidos, sociedade e seu gerente, que atuavam na área de fornecimento de material médico e hospitalar aos hospitais e unidades de saúde de ilha da Secretaria Regional da Saúde” atribuiriam “vantagens de expressão económica a funcionários daqueles serviços de saúde, em ordem a serem favorecidos nas adjudicações de contratos de fornecimento de bens, quer em concursos públicos, quer por ajustes diretos”.
Em comunicado divulgado hoje, o Tribunal Judicial da Comarca dos Açores adianta que durante a instrução “foram suscitadas várias nulidades processuais”, indicando que “o processo seguirá para a fase de julgamento apenas em relação a parte dos episódios factuais narrados na acusação”, pois “noutra considerável parte, secundou o entendimento da defesa de vários arguidos”.
Assim, de um total de 16 arguidos acusados, foi proferido o despacho de pronúncia relativamente a oito e o despacho de não pronúncia em relação aos outros oito.
E, destes oito arguidos seis podem ainda pedir supensão provisória do processo.
“O processo prosseguirá para a fase seguinte subsequente do julgamento perante o Tribunal Coletivo do Juízo Central Cível e Criminal de Ponta Delgada, a fim do apuramento da responsabilidade jurídico-criminal de pelo menos dois arguidos. Quanto aos demais seis arguidos, o JIC [Juízo de Instrução Criminal] pondera a aplicação da suspensão provisória do processo, aguardando que o Ministério Público e cada um deles se pronunciem acerca desta possibilidade de desfecho consensual do caso”, é referido.
Dos oito arguidos pronunciados, foi proferido o despacho de pronúncia da sociedade arguida por três dos 15 crimes pelos quais vinha acusada e do sócio-gerente por quatro dos 16 crimes pelos quais vinha acusado.
Quanto aos restantes seis arguidos, foi proferido o despacho de pronúncia por um total de 11 crimes.
“Em relação a grande parte dos crimes de corrupção ativa e passiva, de recebimento indevido de vantagem e de abuso de poder, o Juízo de Instrução Criminal de Ponta Delgada entende que não se mostram suficientemente indiciados os pactos corruptivos” entre a sociedade arguida fornecedora de equipamentos e produtos hospitalares e os arguidos”, lê-se ainda.
Ainda segundo a decisão instrutória, “nos poucos casos em que efetivamente se evidencia a indiciação do nexo de ligação entre as ofertas e as vantagens (enquanto “duas faces da mesma moeda”), estas configuram meras bagatelas (tal como o empréstimo de uma viatura, por uma vez, para o transporte de móveis) ou dádivas tidas como socialmente acolhidas e aprovadas (tais como chocolates e ananases pela ocasião das festividades natalícias), não assumindo as condutas, como tal, nenhuma dignidade penal”.
Por outro lado, “é entendido que o custeamento de despesas de formação dos enfermeiros por terceiros (ex: pagamento ou reembolso de despesas com as passagens aéreas, a estadia ou a inscrição no evento formativo/congresso) era, à data, uma prática generalizada, normal e regular aos usos e costumes do setor”.
E, acrescenta, “a esmagadora maioria dos arguidos beneficiados não tinha qualquer poder de determinação ou de decisão na escolha do fornecimento de produtos e equipamentos comercializados por tais empresas patrocinadoras, de entre as quais a sociedade arguida”.
A decisão instrutória é suscetível de recurso pelo prazo alargado de 60 dias (atenta a excecional complexidade do processo) e limitado à procedência da nulidade processual e à parte da não pronúncia, segundo é explicado ainda, no comunicado assinado pelo juiz presidente do Tribunal Judicial da Comarca dos Açores, Pedro Soares de Albergaria.
O processo foi distribuído ao Juízo de Instrução Criminal de Ponta Delgada em setembro de 2024, tendo a instrução sido recebida, “após vicissitudes várias, em fevereiro de 2025”, adianta ainda.