Cerca de 90.000 palestinianos rezaram hoje na mesquita de Al-Aqsa, na Cidade Velha de Jerusalém, sob forte segurança das forças israelitas, nas primeiras orações de sexta-feira do mês sagrado muçulmano do Ramadão.
Milhares de pessoas deslocaram-se da Cisjordânia para Jerusalém para as orações, depois de Israel ter autorizado a entrada no território ocupado de homens com mais de 55 anos e de mulheres com mais de 50 anos para as orações.
As tensões aumentaram na Cisjordânia nas últimas semanas, devido aos ataques israelitas a milícias, mas hoje não houve, até agora, sinais de atritos.
Esta foi a primeira oportunidade que os palestinianos tiveram de entrar em Jerusalém desde o último Ramadão, há cerca de um ano, quando Israel também autorizou a entrada dos fiéis, em semelhantes condições restritivas.
Desde o início da guerra entre Israel e o movimento islamita palestiniano Hamas, a 07 de outubro de 2023, o Governo israelita impediu os palestinianos da Cisjordânia de atravessar para Jerusalém ou visitar Israel.
Os cortes efetuados pelo Governo do novo Presidente norte-americano, Donald Trump, na Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID) também dificultaram a ação dos grupos de ajuda humanitária que operam na Faixa de Gaza.
No último Ramadão, a guerra estava ao rubro, mas agora está em vigor desde meados de janeiro um frágil cessar-fogo, cujo futuro é incerto.
Desde domingo, Israel proibiu a entrada na Faixa de Gaza de quaisquer alimentos, combustíveis, medicamentos e outras provisões para cerca de dois milhões de pessoas, exigindo que o Hamas aceite um acordo revisto.
Naquele enclave palestiniano, milhares de pessoas reuniram-se hoje para as orações comunitárias de sexta-feira nos escombros de betão da Mesquita Imam Shafi’i, na Cidade de Gaza, fortemente danificada pelas forças israelitas durante mais de 15 meses de guerra.
Durante o Ramadão, os muçulmanos jejuam desde a aurora ao pôr-do-sol em sinal de humildade, submissão a Deus e solidariedade com os pobres e famintos.
Na quinta-feira à noite, os palestinianos penduraram luzes festivas do Ramadão em torno dos escombros dos edifícios destruídos que rodeiam o seu acampamento na Cidade de Gaza e colocaram longas mesas comunitárias para centenas de pessoas, onde grupos de ajuda humanitária serviram ao final do dia ‘iftar’, a refeição que quebra o jejum diário.
Na mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém, Nafez Abu Saker disse que saiu de casa, na aldeia de Aqraba, no norte da Cisjordânia, às 07:00 (05:00 de Lisboa), demorando três horas a fazer a viagem de 45 quilómetros através dos postos de controlo israelitas para chegar a Jerusalém.
“Se as pessoas da Cisjordânia forem autorizadas a vir, pessoas de todas as cidades, aldeias e campos virão a Al-Aqsa para rezar”, disse ele.
“A recompensa de rezar aqui é igual a 500 orações - apesar da dificuldade do caminho para cá chegar. É uma grande recompensa de Deus”, disse Ezat Abu Laqia, também de Aqraba.
Os fiéis formaram filas para ouvir o sermão de sexta-feira e ajoelhar-se em oração aos pés da dourada Cúpula da Rocha, no extenso recinto da mesquita. O Fundo Islâmico, que supervisiona o complexo de Al-Aqsa, indicou que 90.000 pessoas participaram nas orações.
A polícia israelita disse ter destacado milhares de agentes adicionais para aquela zona.
O local, venerado pelos judeus como o Monte do Templo, e a área circundante da Cidade Velha de Jerusalém são historicamente palco de confrontos entre palestinianos e a polícia israelita.
A Cidade Velha faz parte da parte oriental de Jerusalém, conquistada por Israel juntamente com a Cisjordânia e a Faixa de Gaza na guerra do Médio Oriente de 1967. Desde então, Israel anexou o setor, embora os palestinianos pretendam juntá-lo aos outros territórios para formar um Estado independente.
Milhares de palestinianos provenientes da Cisjordânia formaram uma fila no posto de controlo de Qalandia, nos arredores de Jerusalém, para assistir às orações. Mas a alguns foi recusado o acesso, ou porque não tinham as autorizações adequadas ou porque o posto de controlo, a dada altura, fechou.
A polícia israelita indicou que as autoridades tinham aprovado a entrada de 10.000 palestinianos da Cisjordânia, mas não disse quantos conseguiram entrar em Jerusalém.
“Todos os jovens, idosos e mulheres estavam aqui à espera. Recusaram-se a deixar passar quem quer que fosse no posto de controlo”, relatou Mohammed Owaisat, que encontrou a passagem fechada quando chegou.
A primeira fase do cessar-fogo entre Israel e o Hamas, que durou 42 dias, entre 19 de janeiro e 28 de fevereiro, permitiu a libertação de 25 reféns israelitas mantidos em cativeiro por milícias em Gaza e dos corpos de outros oito, em troca da libertação de quase 2.000 palestinianos presos por Israel.
Mas a segunda fase do acordo de cessar-fogo - destinada a libertar os restantes reféns e a estabelecer uma trégua duradoura e uma retirada total de Israel da Faixa de Gaza - foi posta em causa. Israel tem-se recusado a entrar em negociações sobre os termos da segunda fase. Em vez disso, pediu ao Hamas que libertasse metade dos reféns restantes em troca de uma extensão do cessar-fogo e da promessa de negociar uma trégua duradoura.
As autoridades israelitas indicam também que o bloqueio da ajuda ao enclave palestiniano vai continuar e poderá mesmo aumentar até que o Hamas aceite a proposta - uma atitude que os grupos de defesa dos direitos humanos e os países árabes consideraram uma “tática de fome”, o uso da fome como arma de guerra. O Hamas exige o cumprimento do acordo de cessar-fogo original.
Uma delegação do Movimento de Resistência Palestiniano (Hamas) chegou hoje ao Cairo para discutir a aplicação do acordo e pressionar para que se passe à segunda fase, indicou o Serviço de Informações do Estado do Egito.
A ofensiva militar de Israel matou mais de 48.000 palestinianos na Faixa de Gaza, na maioria mulheres e crianças, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, que não indica quantos dos mortos eram membros de milícias.
A guerra foi desencadeada por um ataque de dimensões sem precedentes do Hamas ao sul de Israel, a 07 de outubro de 2023, em que combatentes mataram cerca de 1.200 pessoas, na maioria civis, e sequestraram 251.
A maioria dos reféns foi libertada no âmbito de acordos de cessar-fogo ou de outras disposições. Pensa-se que o Hamas ainda tem 24 reféns vivos e os corpos de 34 outros.