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Artigo de Opinião

Psicóloga Clínica

24/03/2022 08:00

Já lidei muito com a morte nos meus 18 anos a trabalhar no IPO do Porto. Muitas pessoas morreram de mão dada à minha. Para muitas pessoas, o meu foi o último rosto que viram ao deixar a crueldade deste mundo. Estive presente no último fôlego de muitas pessoas, que não puderam ter alguém dos seus presente. Tive o privilégio de ser "um dos seus" nos últimos instantes da sua vida.

Já lidei com muitas mortes trágicas, geralmente causadas por acidentes de viação, quando, em regime de voluntariado, criei o Núcleo de Intervenção Psicológica em Emergência e Crise, na Associação Perdas e Afectos (entretanto extinta), da qual fui cofundadora, e atuávamos em parceria com o Corpo de Bombeiros de Baltar. Muitas vezes transmiti o falecimento de entes queridos aos seus familiares… tão difícil, mas tão necessário que era… Tantas, mas tantas vezes mesmo me cruzei com a morte no meu percurso profissional. Mas a morte e o sofrimento é algo a que nunca nos habituamos. Dói de cada vez que há más notícias a transmitir. Dói quando vemos o desespero de quem nos olha nos olhos à espera que não seja verdade. Nunca nos habituamos ao desespero, ao choro compulsivo, à dor.

Escrevo desta forma porque, apesar de todo o percurso que, muito sucintamente (mesmo) descrevo, é-me muito difícil, angustiante mesmo, ver o que se está a passar no mundo, as atrocidades que se estão a cometer contra a vida e dignidade humanas. É-me muito difícil, atrevo-me a dizer revoltante mesmo, sentir a impotência na incapacidade da proteção de inocentes que sofrem pela sofreguidão de mentes inquietas, mentes malévolas que buscam nem sabem bem o quê.

Recordo-me de um momento em particular no meio desta guerra, de uma imagem. Lembro-me que, mais uma vez, estava sentada na beira do sofá, incrédula a olhar para o desenrolar dos acontecimentos na televisão. Vi, como muitos de vocês certamente viram, um pai com um bebé ao colo e a mãe, ensanguentada em visível desespero, atrás a chorar. O bebé fora morto, numa guerra da qual nem teria noção que estava a acontecer. Lembro-me que não consegui conter as lágrimas. Não consegui ver mais aquele horror que me entrava pela TV. Chorei de revolta, de impotência, de angústia. Não pensei que ainda fosse possível tamanha maldade. Talvez seja ingénua, talvez ainda acredite na bondade dos seres humanos. Mas, apesar da revolta que me assolou, e que ainda toma conta de mim ao pensar nesta guerra, ainda acredito na bondade das pessoas, admiro e respeito cada vez mais as pessoas que defendem os seus valores, as suas convicções, aqueles que vestem a farda e, literalmente, defendem a sua pátria, o que é tão seu e lhes querem roubar de forma cruel e malvada.

Não quero tecer considerações de ordem técnica, pois muito haveria a analisar e a discutir, apenas partilhar um sentimento de injustiça e revolta com o qual certamente muitos se identificarão.

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