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Artigo de Opinião

Coordenadora do Centro de Estudos de Bioética – Pólo Madeira

17/03/2022 08:00

Por um lado, este tema pode parecer fascinante, devido ao poder do ser humano em ludibriar a natureza e a divindade da vida, ao poder escolher quando deseja morrer, ao driblar a doença e ao saber que irá ressuscitar futuramente, são e curado. Por outro lado, este tema causa alguma perturbação porque, até ao momento, não existe nenhuma prova ou garantia científica de que as pessoas que se submeterem a este procedimento poderão, efetivamente, voltar à vida.

Existem diversos problemas éticos que se levantam relativamente a este tema. Não é clara a responsabilidade destas empresas, no tempo. Se um dia ficarem sem recursos financeiros ou se houver um problema com o armazenamento dos corpos ou dos cérebros, não é inequívoco o procedimento a seguir. Devem cuidar incondicionalmente destas pessoas? Se sim, em que condições? Existe alguma indemnização pelos danos causados? Se sim, quem é o beneficiário? Será que passados centenas de anos, aquela pessoa ainda tem descendentes?

Tendo em conta, o processo complexo de restaurar a vida das células, dos órgãos, dos vasos sanguíneos; e, a incerteza de poder trazer a vida a uma pessoa já falecida, é difícil de admitir que uma pessoa possa voltar à vida com a função cerebral totalmente restaurada ou que tenha memórias sobre a sua vida, antes da sua primeira morte. O que é poderá acontecer caso tentem ressuscitar uma das pessoas e verifiquem que todo ou parte do processo falhou?

Imaginemos que a tecnologia permite ressuscitar as pessoas que se encontram criopreservadas. Como será acordar passados centenas ou milhares de anos? Será que aquela pessoa estava informada e consciente da realidade que iria enfrentar? Como é que é analisada a atualidade do consentimento? Todos os familiares conhecidos, os amigos e os colegas de trabalho já terão falecido. Como é que aquela pessoa irá sobreviver? Que meios terá ao seu dispor? Que tipo de mundo estará a habitar? Será garantido o apoio, por parte de equipas multidisciplinares, para ultrapassar o medo, a solidão, a depressão, o isolamento e para garantir uma adaptação harmoniosa no novo meio? Será que a criopreservação humana e o acordar para uma nova vida vão ao encontro das espectativas daquela pessoa? Talvez, a vontade de viver mais, pode não fazer sentido quando as pessoas amadas já não existem, quando os locais de referência se encontram ocupados e quando é necessário aprender a viver, sozinhos, de novo.

A criopreservação humana também pode causar graves impactos no Mundo. Somos mais de 7,7 biliões de pessoas a habitar o Planeta Terra. A humanidade, em menos de um ano, esgota os recursos naturais que o planeta tem e que leva, pelo menos, 12 meses a renovar. O nosso Planeta está superpovoado e sabemos que os recursos naturais são escassos. A morte, é um processo natural de renovação e reposição da população. Se todos decidirem viver e alcançar a imortalidade que tipo de Planeta teremos? Será que o Planeta Terra teria capacidade de dar resposta às necessidades de todos os humanos imortais?

Como vemos, são mais as dúvidas do que as certezas. A ciência e a tecnologia são fundamentais e a sua evolução é necessária. No entanto, vale sempre relembrar, que nem tudo o que é tecnicamente possível é eticamente aceitável. Recordo as palavras do Papa Francisco, numa conferência internacional sobre medicina regenerativa, "a ciência, como qualquer outra atividade humana, sabe que tem limites a respeitar para bem da própria humanidade e necessita de um sentido de responsabilidade ética".

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