A cultura vitivinícola do Estreito é uma tradição centenária. Ao longo de gerações, os estreitenses transfiguraram a terra. Graças ao clima favorável, aos solos vulcânicos e à paixão pela terra, os estreitenses geraram o reconhecido Vinho Madeira e imprimiram na paisagem um vasto manto de vinhedos se estendem pelas encostas.
Neste ano, fruto de condições climatéricas excecionais, vindimou-se mais cedo do que o habitual. Em linha com a colheita no ano transato, dos vinhedos de Câmara de Lobos saíram aproximadamente duas mil toneladas de uvas. Ou seja: cerca de metade do total da colheita produzida em toda a Madeira e Porto Santo. E tem sido sempre assim ao longo dos anos!
Os mais de seiscentos viticultores do concelho contribuem, com o seu trabalho e esforço, para a produção de mais de metade de todo o vinho produzido na Madeira. Têm sido, e são, um ativo essencial para a dinamização económica do setor vinícola, que em 2022 gerou uma receita que ascendeu os 22 milhões de euros, perspetivando-se, para os anos vindouros, um cenário de crescimento.
Mas a importância da paisagem vinhateira do Estreito transcende as quantidades de toneladas de uvas colhidas ou a receita gerada pelo Vinho Madeira. As vinhas em socalcos, cuidadosamente cultivadas ao longo de séculos, são testemunho vivo da relação harmoniosa do homem com a natureza, do saber transmitido de geração em geração.
A paisagem vinhateira do Estreito de Câmara de Lobos é um património singular. Imprime um caráter identitário ao território e é um ativo de valor para o destino Madeira. Por isso, preservar de forma sustentável a paisagem humanizada é também condição essencial para continuar a atrair visitantes.
Visitar o Estreito de Câmara de Lobos é entrar num paraíso vinícola, onde as íngremes encostas, as vinhas e o vinho se unem em perfeita harmonia. Uma experiência que supera o paladar, toca a alma e deixa uma marca perene na memória. Uma marca que nos lembra que o Vinho Madeira é mais do que uma bebida: é uma celebração da vida.
É neste contexto que a Festa da Vindimas faz sentido. É um momento para homenagear, justa e merecidamente, a tenacidade das centenas de viticultores que labutam nas encostas íngremes, transformando-as no paraíso vinícola que perdura ao longo dos séculos e marca a paisagem da freguesia.
Mas é também um momento para refletir sobre o valor que todos nós atribuímos (ou devíamos atribuir) a esse património cultural e paisagístico. Já tive oportunidade de, neste espaço de opinião, refletir sobre a importância da preservação dos vinhedos do Estreito. Não só pela necessidade de preservar a identidade do território, como pela importância que representa para a economia da Região e para a valorização do destino Madeira.
Se aceitamos que a paisagem vinícola do Estreito de Câmara de Lobos acrescenta valor ao produto turístico Madeira (e acrescenta), então esse setor tem de contribuir, de uma forma líquida, para a preservação daquele património. Os custos de oportunidade inerentes à preservação dessa paisagem não podem recair apenas sobre os viticultores, os proprietários dos terrenos agrícolas ou, mesmo, sobre concelho em que se localizam. Sendo um ativo paisagístico e natural para todos, em especial para o setor turístico, então todos são chamados a "se chegar à frente" e garantir condições para financiar os custos inerentes à sua preservação.