Independentemente da classe social, da cor, da origem ou da circunstância, todos concordamos que a saúde é o nosso “bem maior”. É um bem público demasiado valioso para ser gerida por impulsos ou agendas de curto prazo.
Nos últimos dias, os custos da saúde têm estado no centro da discussão pública. Os nossos governantes revelam oportuno discernimento ao afirmar a imperatividade da eliminação de desperdícios e redundâncias desnecessárias para garantir a sustentabilidade do sistema.
No entanto, esta sensatez torna-se insuficiente se não vier acompanhada de uma alteração estrutural profunda. A verdadeira sustentabilidade, seja na saúde ou em qualquer outro setor, não se consegue apenas com cortes; exige visão estratégica, capacidade de análise, sentido de oportunidade e coragem política para diagnosticar a situação e reorganizar o sistema.
A Região Autónoma da Madeira enfrenta hoje um desafio que é financeiro, organizacional, mas também estrutural: garantir a sustentabilidade de um sistema de saúde pressionado pelo envelhecimento demográfico, pela crescente prevalência de doença crónica e por um modelo de prestação de cuidados que em vez de estar assente na comunidade, está centrado no hospital.
Os dados nacionais do relatório RADIS são elucidativos. No ano de 2024 Portugal gastou em saúde 2.664 € por habitante, cerca de 20% abaixo da média europeia, apesar de a despesa em saúde representar 10,03% do PIB, valor superior ao da média da UE. Isto significa que temos um sistema que gasta muito em proporção ao que produz.
A Madeira não dispõe de um relatório independente e sistemático como o RADIS, que possibilite conhecer em profundidade o verdadeiro estado da saúde na Região. E, como lembra o economista Pedro Pita Barros, “sem informação e sem medição de resultados, não há gestão possível”. Sem diagnóstico não há intervenção eficaz.
Porventura, e perante as mudanças profundas na administração do SESARAM, não seria de todo descabido reunir profissionais dos cuidados primários, hospitalares, saúde pública, gestão, academia e associações de doentes, pedindo-lhes que, de forma voluntária e independente, realizassem uma análise rigorosa não apenas aos indicadores de saúde, mas também às necessidades concretas em termos de estruturas físicas, recursos humanos e equipamentos clínicos, identificando fragilidades e prioridades de investimento para a organização.
Apenas com um diagnóstico sólido será possível compreender, por exemplo, onde faltam profissionais, onde há excesso ou falha na alocação de recursos, que serviços necessitam de reforço ou reorganização, quais os equipamentos obsoletos que devem ser substituídos e que infraestruturas exigem renovação para garantir segurança, eficiência e qualidade.
Uma análise integrada deste tipo permitiria traçar um plano estratégico de sustentabilidade que ultrapasse os ciclos políticos, capaz de orientar decisões de médio e longo prazo com base em evidência, racionalidade económica e necessidades reais da população, e não apenas em ciclos políticos ou respostas reativas.
A sustentabilidade não se alcança apenas a cortar no desperdício. Tornar a saúde sustentável passa por aumentar a produtividade e responsabilizar os gestores. É necessário valorizar remuneratoriamente os recursos humanos, mas esses aumentos remuneratórios devem traduzir-se necessariamente em mais eficiência, melhor desempenho, aumento da produtividade e da eficácia operacional, garantindo que cada euro investido gera mais valor em saúde para a população.
Importa diagnosticar e, com transparência, ter a coragem para definir metas e concretizá-las. Porque essa é uma responsabilidade pública.