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Artigo de Opinião

15/10/2025 08:00

A opinião pública ainda tem algumas dúvidas sobre o papel de um doutoramento na sociedade. Eu, aluno finalista do Doutoramento de Química na Universidade da Madeira, deparo-me frequentemente com esta situação, dentro e fora da Academia. No geral, parece que um doutoramento só serve para ser professor universitário, ou para matar aquele bichinho curioso de querer saber mais sobre um tema ou matéria, mas sem uma razão suficientemente forte que, para o cidadão comum, justifique continuar a estudar para além do mestrado, já que lhe custou tanto terminar a licenciatura e encara o mestrado como algo já de si bastante exigente.

O Quadro Europeu de Qualificações desmistifica na perfeição estas ideias, separando a informação em Conhecimentos, Aptidões e Atitudes. Por simplicidade, comparemos as qualificações dos níveis 6 e 8, licenciatura e doutoramento, respetivamente. No primeiro, espera-se que o licenciado possua um “conhecimento aprofundado de uma determinada área de estudo ou de trabalho que implica uma compreensão crítica de teorias e princípios”. Já do doutorado espera-se que tenha “conhecimentos de ponta na vanguarda de uma área de estudo ou de trabalho e na interligação entre áreas”; e não seria de esperar outra coisa, não tivesse o doutorado trabalhado de forma focada num tema durante, no mínimo, três anos. Na parte das aptidões para os detentores de licenciatura temos: “aptidões avançadas que revelam a mestria e a inovação necessárias à resolução de problemas complexos e imprevisíveis numa área especializada de estudo ou de trabalho”. De um doutorado espera-se “as aptidões e as técnicas mais avançadas e especializadas, incluindo capacidade de síntese e de avaliação, necessárias para a resolução de problemas críticos na área da investigação e ou da inovação para o alargamento e a redefinição dos conhecimentos ou das práticas profissionais existentes.” Aqui observa-se uma clara diferença. O licenciado saberá resolver problemas, mas o doutorado, além disso, terá visão para transformar por completo o paradigma da sua área de trabalho. Por fim, em termos de atitudes, o licenciado deve saber “gerir atividades ou projetos técnicos ou profissionais complexos, assumindo a responsabilidade de tomada de decisões em contextos de estudo ou de trabalho imprevisíveis. Assumir responsabilidades em matéria de gestão do desenvolvimento profissional individual e coletivo”. As atitudes esperadas de um doutorado vão mais além, devendo “demonstrar um nível considerável de autoridade, inovação, autonomia, integridade científica ou profissional e assumir um firme compromisso no que diz respeito ao desenvolvimento de novas ideias ou novos processos na vanguarda de contextos de estudo ou de trabalho, inclusive em matéria de investigação.” É importante perceber que as aptidões e atitudes que um doutorando adquire ao longo da sua formação tornam-no capaz de aplicar essas competências em qualquer contexto. Afinal, aprendeu a trabalhar com método, disciplina e rigor ao longo de anos.

Parece existir uma confusão entre os conhecimentos e as aptidões e atitudes que se esperam de um doutorado. Se por um lado sabemos muito sobre a nossa área de conhecimento e de formação, por outro, sabemos fazer muito mais do que estudar e investigar. Costumo dizer que, através da escrita de projetos, de candidaturas e de relatórios, da participação em atividades lúdicas, e da comunicação de trabalhos, a minha formação tornou-me capaz de trabalhar tanto dentro como fora do laboratório. Se é importante ter um químico a desenvolver investigação num centro ou empresa e alavancar a produção científica e técnica no país, por outro, esse mesmo químico tem a capacidade de vingar em mil outros contextos onde a química nem está presente. É redutor encerrar as pessoas nas caixinhas dos seus cursos e perguntar um doutoramento só “serve para dar aulas, não é?”. Somos muito mais do que aquilo que estudámos.

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