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Artigo de Opinião

CONTOS INSULARADOS

13/11/2022 06:52

Fazer memórias. É um hastag dos tempos que correm. Antigamente não havia hastags e a canalha levava de régua - vá há aqui algum exagero e que me perdoem os meus professores se estiverem a ler, mas é o chamado excesso literário e literário também talvez seja hipérbole- se escrevessem palavras pegadas, ‘assim-como-se-diz-e-sem-hífen’.

Mas na era das redes sociais, as palavras aparecem juntinhas para criar tração para um tema, pessoa ou negócio e já não é reles como na primária (quando se chamava assim, já sei que é primeiro ciclo agora ou #1ciclo) naquele tempo, em que "tração era às 4" para se andar na serra e cabeços. Mas voltando ao tema, fazer memórias (assim ou em inglês - #makingmemories - como está na moda nos anos dos unicórnios, no calendário da República Popular da Web) é assim uma coisa que vai bem e quem nunca a usou que atire a primeira pedra, ou que seja o primeiro hatter. Isto hoje é só modernice, tenham paciência.

E porque é que é que a conversa pendeu para aqui? Ora, tudo começou com o São Martinho e com uma fotografia de um magusto à moda antiga com sarimba, que no continente é caruma, em camadinhas como na infância e não como agora com um saquinho de castanhas em papel pardo ou em jornal. A pessoa quando vai para longe tende a achar que as tradições desaparecem quando deixamos de as cumprir, mas o mundo #pulaeavança (vou parar). E o que é que veio à cabeça? A avó a dizer: "Tens mascarras na cara ou tens a cara toda mascarrada" e a pessoa desata a rir à gargalhada de olhos postos no telemóvel, como se faz atualmente e ninguém estranha. E dá por si a pensar nessa coisa fantástica que é a memória, que, por mais que se tente, não é assim uma coisa que se fabrique ou guarde em gavetas etiquetadas com palavras escritas todas juntas e sem hífen para fazer tração que não às 4. Estou em crer que é a anarquia total, guarda o que quer e como quer para lembrar quando lhe dá na cabeça.

Não sei se os nossos pais e avós pensavam na importância de deixar memórias à sua descendência, mas certamente - quando preparavam o magusto e nos deixavam saltar a fogueira - não esperavam que o que ficaria gravado para sempre era a cara suja das cinzas e das castanhas pretas, que descascávamos antes de arrefecerem e com que pintávamos bochechas, roupa e o que aparecesse. "Estás todas mascarrada". Rio-me outra vez, com pena de talvez não deixar essa memória a quem vem a seguir, porque não basta escrever junto sem acentos e sem hífens e com #, mas era mesmo bom que funcionasse assim e que tivéssemos mão na fábrica de memórias que todos somos.

Sandra Cardoso escreve ao domingo, de 2 em 2 semanas

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