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Artigo de Opinião

Economista

26/02/2022 08:00

Que limbo é esse? Um parlamento nacional que só se reúne de emergência em modo reduzido de comissão permanente, e um governo à espera de tomar posse, num país onde curiosamente a única assembleia que reuniu esta semana em plenitude de funções para reagir com um voto de protesto foi a Assembleia Legislativa da Madeira.

Onde, sem surpresas, o sentido de voto foi claríssimo: todos os partidos a favor do protesto contra a invasão da Ucrânia, menos um - o PCP. O mesmo partido que professa um contorcionismo histórico e político para defender que existe um fator que fala mais alto do que a solidariedade com o povo da Ucrânia, nomeadamente a sua partilha com Putin do mesmo inimigo da URSS - EUA/NATO.

Sem pestanejar, o PCP acaba tecnicamente por transferir a sua antiga lealdade à União Soviética ao atual presidente russo, mesmo quando este inclusivamente usa o argumento do processo de descomunização para questionar a integridade territorial da Ucrânia. É isto que acontece quando as instituições se agarram à sua infalibilidade dogmática, ao invés de abrirem os olhos à realidade que os circunda. O último que apague a luz à saída, pois a coerência já deixou o prédio do PCP há algum tempo.

Olhando para a resposta da UE, está na altura de a Europa sintonizar melhor a consternação política com a força das suas sanções ao regime russo. O sistema financeiro internacional dita que à medida que o preço do petróleo sobe, não só beneficia "empresas" russas como diretamente os cofres do estado russo, uma vez que as regras nacionais ditam que todo o lucro acima dos $43 por barril é diretamente canalizado para o fundo soberano russo.

Considerando que o valor das importações petrolíferas e minerais vindas da Rússia são mais elevadas que a despesa militar do Kremlin, percebe-se rapidamente a argumentação cristalina do Primeiro-ministro polaco quando defendeu sanções mais fortes: "Compramos gás e petróleo russo. E o Presidente Putin pega no nosso dinheiro europeu dessas vendas e transforma-o nesta agressão e invasão".

Compreende-se a reticência em cortar bruscamente esta ligação, seja por motivos económicos ou sociais dentro da UE. Mas convém recordar que as lideranças europeias prometeram reduzir a dependência europeia do gás russo aquando da invasão da Crimeia em 2014. Aconteceu precisamente o oposto: em 2015 a Rússia contabilizava 36% do consumo de gás na Europa, 41% em 2018, para representar atualmente 40%. O preço da democracia europeia não pode ser unilateralmente pago pela população ucraniana. Para além de uma união económica, a União Europeia é uma comunidade de valores partilhados - entre Estados-membros, mas com expressão para além das nossas fronteiras, em especial no continente europeu.

A solidariedade com a Ucrânia vai de mãos dadas com a solidariedade com o povo russo sem voz, que sofre com a má-gestão política, económica e militar do autocrata Putin. As imagens das manifestações inauditas que ocorreram estes dias em dezenas de cidades russas demonstram a enorme coragem cívica desses cidadãos num país onde não reina a liberdade de expressão nem a independência judicial. Sejamos coerentes na nossa defesa dos princípios democráticos.


Sugestão da Semana: O abalo bélico faz-nos acordar para a realidade do conflito armado no nosso continente, tantas vezes repetido no passado. Um livro que hoje ecoa os presságios do passado - "O Mundo de Ontem" de Stefan Zweig (1941).

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