Os manifestantes de extrema-direita que hoje protestaram “Contra a islamização da Europa” levaram elogios ao ditador Salazar às ruas de Lisboa, mas muitos cidadãos responderam com insultos e acusações de fascismo.
A trabalhar há um ano numa loja de recordações numa das ruas por onde passou a centena de militantes de extrema-direita, o bangladeshiano Ravi não sabia que a manifestação era contra imigrantes, portanto, contra si. “Pensava que fossem uma claque de futebol”, disse, olhando para os archotes e os fumos acesos que se viam e cheiravam na rua Nova do Almada.
Mas Patrícia sabia da manifestação e veio ver o que se passava. “Vim ver o que era isto e não me surpreendeu o que vi: são poucos, primitivos e ignorantes”, afirmou à Lusa, instantes depois de lhe ter sido arremessada uma tocha.
À passagem da manifestação, Patrícia foi uma das pessoas que levantou a mão com um insulto ao grupo, sempre em silêncio. Em resposta, um dos manifestantes atirou-lhe a tocha, tendo sido admoestado por um colega que lhe disse: “Não estamos aqui para responder a provocações. Ela foi paga para estar aqui”.
Mas Patrícia nega: “Não sou de nenhum partido. Portugal é nosso e não deles. Portugal é de todos e não destes medievais”.
“Portugal é nosso e há-de ser” era uma das poucas músicas cantadas pelo grupo, além do hino nacional. Apesar de vários momentos de tensão, Mário Machado insistia para que os manifestantes não reagissem a insultos e respeitassem as autoridades, que montaram um forte dispositivo de segurança em redor da centena de ativistas.
Nas traseiras da manifestação, três dezenas de pessoas improvisaram uma contramanifestação, gritando “25 de Abril sempre” ou “fascismo nunca mais”.
Alguns deles estavam associados a movimentos organizados ambientalistas e organizações de extrema-esquerda, mas juntaram-se-lhes outras pessoas.
Em resposta aos gritos de “não passarão”, o grupo de manifestantes de extrema-direita respondia: “já passámos”.
Beatrice, 17 anos, e Carolina, 18, estavam a fazer compras no Chiado quando os militantes de extrema-direita passavam na rua e decidiram associar-se à contra-manifestação.
“Esta gente não sabe História? Elogiam o Salazar?” – questionou Beatrice, que quis mostrar que “a extrema-direita não tem lugar em Portugal”.
Carolina vai votar pela primeira vez no dia 10 de março e não sabe qual a sua escolha. Mas de uma coisa tem certeza: “Estes tipos e quem defende estes tipos? Nunca!”.
De boina preta na cabeça, dos resistentes antifascistas, Carlos Cruz, cerca de 70 anos, abordou várias vezes o grupo, insultando-o, com críticas ao Estado por autorizar a manifestação.
“O fascismo é a organização do capital financeiro contra o mundo do trabalho. Vocês não estão a ver o fascismo a crescer por toda a Europa?” – repetiu, em mais do que uma ocasião.
Apesar dos insultos ocasionais e de algumas respostas mais acaloradas, o dirigente de extrema-direita Mário Machado conseguiu controlar o grupo, insistindo numa ação ordeira que terminou perto das 19:30, na Praça do Município.
Aí, Mário Machado criticou a Assembleia Municipal, “com exceção do Chega”, por ter condenado a manifestação e prometeu ações semelhantes.
“Queríamos fazer no Martim Moniz e não nos deixaram. Mas esta é a nossa força. Este é o nacionalismo e o patriotismo”, afirmou.
A algumas centenas de metros, Ravi não sabia dessa intenção. “Eu vivo lá perto, ainda bem que não foram para lá, que poderia ter havido mais problemas”, disse.