A 4.ª edição da Conferência Internacional de Estudos de Fotografia (CIEF) abriu esta quarta-feira, no auditório da Reitoria da Universidade da Madeira, reafirmando o Funchal como palco de encontro de uma comunidade crescente de investigadores, artistas e curadores dedicados à fotografia e, em particular, ao livro de fotografia.
A iniciativa, que decorre até sexta-feira, resulta de uma parceria entre a Secretaria Regional de Turismo, Ambiente e Cultura — através da Direção Regional do Arquivo e Biblioteca da Madeira (DRABL) e da Direção Regional da Cultura (DRC) — o ICNOVA – Instituto de Comunicação da Universidade Nova de Lisboa e a Universidade da Madeira.
Sob o tema ‘Publicar Fotografia: materialidades, narrativas, montagens’, a conferência junta cerca de meia centena de participantes em comunicações, mesas-redondas e atividades paralelas, envolvendo autores e especialistas de Portugal, Brasil, Reino Unido e França.
Na sessão de abertura, Teresa Mendes Flores, investigadora do ICNOVA e membro da comissão organizadora, sublinhou o percurso feito desde a génese da CIEF, em 2019, ligada à reabertura do Museu de Fotografia da Madeira – Atelier Vicente’s, e a figura de Margarida Medeiros.
“Ficamos muito contentes de ver aqui reunida uma comunidade crescente de pessoas interessadas na fotografia e nas suas diferentes frentes e, portanto, criar uma comunidade à volta da Conferência é isso que também se pretende e eu acho que isso tem sido um objetivo que está a ser conseguido e que vai crescendo”, afirmou, lembrando que o encontro regressa à Madeira de dois em dois anos.
A investigadora destacou ainda o papel descentralizador da iniciativa, referindo que “o ICNOVA está muito contente por esta parceria”, que espera poder continuar e que permite não “fazer tudo em Lisboa”. “Portugal não é Lisboa e trazer aqui pessoas de várias zonas do país e de fora do país também é muito importante.”
Sobre o tema desta edição, Teresa Mendes Flores considerou que “publicar fotografia” é hoje um eixo central de reflexão, num tempo marcado pela desmaterialização digital: “A fotografia nasce com uma vocação pública e ela também tem logo na sua própria ontologia um processo de impressão. Este tema surgiu-nos como um tema muito importante não só porque nós vivemos num mundo desmaterializado, num mundo digital, que são outras formas de publicação, que muitas vezes no scroll das imagens acaba por as tornarem indiferentes e isso é tudo aquilo que nós não queremos.”
Daí a aposta em curadorias que “revalorizam os livros e os livros de fotografia”, numa relação histórica que ganha relevo “neste mundo desmaterializado”.
A organização sublinha ainda a presença dos dois keynotes desta edição — Jorge Ribalta e Rosângela Rennó — e a dimensão internacional da conferência, com cerca de 50 intervenções em sessões paralelas: “O sucesso deste encontro é das pessoas que participam, é da qualidade das vossas comunicações (...) queria agradecer a vossa presença e a vossa participação e desejar a todos uma boa conferência”, concluiu.
UMa quer “continuar esta deriva académica e institucional”
O reitor da Universidade da Madeira, Sílvio Fernandes, valorizou a parceria alargada que sustenta a conferência e a abertura da instituição à cidade e à Região, através da cultura.
“Cada vez mais a Universidade da Madeira tem feito este recurso, que é aumentar as parcerias com instituições ”, referiu, lembrando eventos recentes nas áreas do cinema e do turismo e um “espetro largo” de iniciativas em colaboração com organismos da Região.
Para o reitor, a CIEF contribui para a criação de massa crítica em torno da fotografia, entendida como instrumento decisivo de memória: “É importante que possamos continuar esta deriva académica e institucional. Porque ela vai permitir que passe a haver massa crítica, e passe a haver registo científico sobre uma matéria para a memória das sociedades.”
Assumindo-se “apaixonado pela fotografia”, Sílvio Fernandes deixou também um alerta sobre a necessidade de tratar e preservar a produção contemporânea de imagens, hoje dispersa e “escondida nos telemóveis”: “Embora esteja muito popularizada e escondida nos telemóveis, é preciso revelá-las. De outra maneira, é preciso manter a atenção, e com mais recursos, porque a quantidade de registo é enorme (...) para que isso possa ser um legado nosso para o futuro.”
Quatro milhões de fotografias é responsabilidade acrescida
Na sua intervenção, o secretário regional de Turismo, Ambiente e Cultura, Eduardo Jesus, sublinhou a importância do modelo de parceria que está na origem da conferência, nascida com a reabertura do Museu de Fotografia da Madeira – Atelier Vicente’s, e destacou o papel de Ana Gandum na criação do projeto. “É uma boa lição que se deixa, através desta conferência, o saber atuar na cultura através de uma parceria. Muitas vezes as iniciativas culturais são isoladas e o facto de serem isoladas complica a sua própria realização e até a viabilidade da sua continuidade no tempo”, afirmou, apontando a articulação entre DRABL, DRC, ICNOVA e UMa como exemplo a seguir.
O governante realçou o rigor científico da conferência, patente na composição da comissão científica e no perfil dos oradores, e a abrangência de um programa que inclui visitas guiadas, exposições, uma mostra de filme e workshops, “que permite alargar bastante o horizonte e captar um público interessado, mas também diverso”.
Eduardo Jesus ligou ainda a realização da CIEF à responsabilidade acrescida da Madeira na gestão do seu espólio fotográfico histórico. “A Madeira (...) teve a sorte de acompanhar o início do processo da fotografia e, em meados do século XIX, nós já tínhamos pessoas dedicadas à fotografia aqui na Madeira”, disse, acrescentando que isto faz com que hoje exista a “enorme responsabilidade na gestão, na organização, na divulgação de toda esta herança.”
Segundo o secretário regional, esse património está hoje quantificado “em cerca de 4 milhões de exemplares positivos e negativos”, número que cresceu de três para quatro milhões na última década, graças à confiança depositada no Arquivo e Biblioteca da Madeira e na Direção Regional da Cultura.
“Cada vez são mais e sucedem-se frequentemente as doações e os depósitos que são feitos no arquivo, cujo conjunto é fotográfico. (...) Acima de tudo, porque as pessoas têm a informação que ali se tratam esses exemplares, se catalogam, descrevem-se cada um deles e colocam-se à disposição. E esta é a função maior do arquivo, não é guardar fotografias. É poder tratá-las e colocá-las à disposição.”
Referindo os investimentos em curso no âmbito do PRR para reforço de equipamento e competências técnicas, o governante assumiu a “enorme responsabilidade” que recai sobre a Região na salvaguarda e divulgação deste espólio e desejou “que esta seja uma edição memorável” da CIEF, capaz de entusiasmar para futuras edições.