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Artigo de Opinião

Economista

2/10/2025 08:00

Portugal vive, desde 1976, na contradição de proclamar Autonomia às suas regiões atlânticas enquanto mantém sobre elas o peso de uma centralização financeira herdada de tradições uniformizadoras. A Lei das Finanças das Regiões Autónomas, sucessivamente revista, é o exemplo dessa ambiguidade: transfere recursos do Estado central para as ilhas, mas ao mesmo tempo perpetua a tutela disfarçada, reduzindo as economias e sistemas fiscais autonómicos a meros apêndices do continente.

Ora, a essência da Autonomia não reside em fórmulas de cálculo inscritas em decretos, mas na dignidade da responsabilidade política. Madeira e Açores não são apenas (ultra)periferias; são comunidades histórico-culturais, com identidade própria, que entraram no pacto constitucional com a promessa de se regerem segundo a sua especificidade. O que se lhes deu foi apenas uma liberdade mitigada, dependente do beneplácito de Metrópole; uma Autonomia, sucessivamente “castrada” pelos “Inquisidores-Mores” do Palácio Ratton sob o dogma herético do “Estado Unitário” (Artigo 6.º da CRP)!

O erro está na tentação igualitária e uniformizadora que sempre marcou o centralismo republicano: a ideia de que a unidade exige uniformidade. Este é um equívoco de raiz jacobina, contrário à tradição portuguesa de pluralismo orgânico. Portugal sempre se fez da diversidade: concelhos com foros próprios, Império e colónias de múltiplas ordens jurídicas (veja-se o caso de Macau no pós-25 de Abril!). O nivelamento absoluto, longe de fortalecer a República, corrói-a na sua vitalidade.

Ao amarrar as Regiões Autónomas a transferências pré-definidas, e a estatutos político-administrativos eternamente dependentes de uma Constituição que as impede de afirmar e legislar plenamente a sua especificidade ultraperiférica, insular e Atlântica no mundo do século XXI. Cria uma Autonomia de papel, incapaz de se traduzir em verdadeira responsabilidade política, fiscal e financeira e consequentemente preparar aquelas parcelas, que garantem a Portugal a maior ZEE da UE, para os desafios do século XXI; os quais não podem ser experienciados por burocratas da que encaram o microcosmo entre São Bento e o Terreiro do Paço como o reflexo verídico do país.

Um país, dois sistemas! É aqui que se impõe a coragem de uma revisão constitucional. Não mais reformas cosméticas, mas a criação de um modelo definitivo de “um país, dois sistemas”. Madeira e Açores devem ter plena autonomia fiscal, orçamental e legislativa sobre todas as matérias que não digam respeito ao exercício de soberania (Defesa, Negócios Estrangeiros, Justiça e Direitos, Liberdades e Garantias). Não se trata de fragmentar a soberania nacional, mas de a fortalecer através da diversidade de regimes.

Assim, a soberania portuguesa permaneceria una, mas a sua expressão político-jurídica seria plural. Assim se cumpre a promessa feita à Madeira e aos Açores e se respeita a lógica da Autonomia: liberdade de decidir e responsabilidade de arcar com as consequências.

A Europa sempre foi mais rica quando respeitou as suas diferenças internas. O Sacro Império sobreviveu séculos porque aceitou múltiplos ordenamentos jurídicos sob a mesma coroa. A Monarquia portuguesa, antes da uniformização republicana, com a devida exceção de Macau, conviveu com foros, isenções e privilégios que não enfraqueceram, antes consolidaram, a unidade do Reino.

Pelo que, seguir esta via não é uma ameaça, é um regresso à sabedoria histórica: a unidade constrói-se não pela imposição da igualdade, mas pela harmonia da diversidade.

Porém, ao persistir na lógica do atual modelo constitucional, é condenar as Autonomias e as suas populações no meio do Atlântico à menoridade e o continente à contradição. O que falta é clareza: um país, dois sistemas. Uma revisão constitucional que transforme a Autonomia em realidade plena, sem prazos, sem tutelas, sem ficções.

Este é um caminho que exige grandeza de visão. Reconhecer que a verdadeira força da República está em aceitar a pluralidade das suas partes. Libertar a Madeira e os Açores para que sejam plenamente autónomos, e com isso reforçar a unidade de Portugal.

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