MADEIRA Meteorologia

Artigo de Opinião

Professora Universitária

28/06/2021 06:14

Um documento tão importante, que marcará o desenvolvimento da Região nos anos mais próximos e que terá consequências nos decénios que nos esperam, deveria ter a atenção aplicada e vigilante de todos. É certo que estávamos concentrados na pandemia, na nossa capacidade individual e familiar de sobrevivência, a adaptar-nos a novos cenários, a tentar compreender as mudanças profissionais, sociais e até psíquicas que o contexto pandémico originou, mas se deixarmos passar um plano que ditará as nossas vidas, com repercussões na comunidade e nas escolhas das gerações futuras, sem uma visão crítica profunda, estamos a participar - de forma inconsciente e apática - no desenho da realidade dos nossos filhos e netos.

E eis-nos com o PRR da RAM à nossa frente. Leio tudo, comparo com o PRR dos Açores, do Estado Português, de outros estados.

Neste ponto, na gigantesca comédia dos anúncios de apoio e das ilusões, resta perceber que parte estão a recitar aqueles políticos que insistem em tentar fazer-nos acreditar que existirá finalmente uma mudança de fundo na Região. Isto é, se são somente destituídos de visão a longo prazo, se o fazem para favorecer interesses, se entendem o PRR como encher a carteira para fins político-partidários ou se, na sua inocência do estado do mundo, acreditam piamente que estão a fazer o bem.

A única certeza é que, passo após passo, estão a condenar a Madeira a um desenvolvimento deficiente e sem vislumbre de futuro. Há décadas que o fazem - depois dos necessários esforços de dotar a Ilha de pequenas e grandes infraestruturas em várias áreas - impertérritos e imperturbáveis. E isto sem a consciência de que agora é o momento de apostar tudo na ciência, na tecnologia, na economia do mar, na cultura, no ensino superior e investigação, no desenvolvimento da agricultura e pescas, e nas indústrias a ela associadas, na educação de ponta (que não quer dizer só tablets e digital, e, neste momento, deveria ser, sem ilusões sobre os milagres da didática digital dos últimos meses, que a muitos excluiu, plano de recuperação face ao ano terrível que vivemos).

Vejamos: o PRR da RAM fixa-se na oferta de habitação apoiada e no fortalecimento das ações sociais (e bem que há necessidade), no fortalecimento do Serviço Regional de Saúde (idem), na digitalização na área da Saúde, no plano de eficiência e reforço hídrico dos sistemas de abastecimento e regadio, na potenciação da eletricidade renovável, na aceleração da digitalização na educação e na transição digital da administração pública. O PRR dos Açores aposta, além da habitação e no programa contra o combate à pobreza, no desenvolvimento do "cluster do mar", na recapitalização do sistema empresarial dos Açores, no relançamento da agricultura açoriana, na qualificação de adultos e aprendizagem ao longo da vida, na capacitação empresarial, etc., etc. O PRR do Estado tem como principal foco, de várias formas, a ciência e a tecnologia, única garantia de futuro para o país, preparando-se para um mundo em que não podemos continuar a depender da venda de serviços aos ricos deste mundo, e a cultura, a que o PRR reserva 243 milhões de euros.

E nós? Nós vemos colocar em palco o mesmo velho, caduco sistema de lidar com os problemas, sem apresentar novas vias. É bonito falar do mar. Pois é. E onde está o mar no PRR: naufragado algures?. Também é lindo visitar empreendimentos agrícolas, criticar a política europeia no que toca à frota pesqueira, justificar não haver indústria de transformação do pescado como nos Açores sabe-se lá com que razões, esconder atrás de tablets as conclusões das agências europeias sobre a falta de massa crítica qualificada na Região.

A aceleração é de marcha atrás. Há, por isso, que ler o PRR e raciocinar como investigadores face a um delito e tentar perceber quem está a matar a esperança da comunidade e como. Só face aos indícios, podemos pensar "cui prodest" - que é mais ao menos seguir os "cujos lucros" e quem deles beneficia. Desculpem-me os leitores o tom triste, mas estou cansada de anúncios com pompa e circunstância e sem esperança, de planos mal engendrados cujas consequências serão apontadas aos outros e nunca a quem os pensou. Incapazes, cúmplices ou vítimas de conjuras de Lisboa ou de Bruxelas? Mudem de marcha.

Luísa Antunes escreve
à segunda-feira, de 4 em 4 semanas

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