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Artigo de Opinião

AQUINTRODIA

12/12/2023 06:00

Era a década de 70.

Íamos chegando de vários lados, com formações e ocupações diversas, vontade de iniciar carreira na terra que nos viu nascer, ou foi adotada por alguma razão.Eram frequentes os convívios que ampliavam amizades trazidas de colegas de aulas, de serviço militar cumprido, ou de experiências laborais.Fomos formando o nosso grupo, dando forma a cumplicidades, gostos e saberes.Começámos a correr as casas de cada um, aproveitando todos os pretextos para estarmos juntos.Descobrimos que havia o gosto comum da cantoria.Foram nascendo as canções, fomos somando temas e sons ao reportório.

Passar apenas pelas nossas casas já se mostrava curto.Então, preparámos um cancioneiro de canções de Natal, outras do cante ou populares, delineámos uma lista de amigos e fomos de porta em porta, combinação prévia, oferecer uma serenata original, com cânticos de abertura, cantigas ao Menino junto aos presépios que nos eram franqueados.Logo entrávamos num convívio de petiscos e copos e cantorias de duração incerta. Dependia da recetividade, do apetite e da inspiração.

A primeira Noite do Mercado

Corria o ano de 1986.No dia 23 de dezembro, fomos cantar ao casal amigo, como havia sido acertado. Qualquer coisa falhou, o casal havia saído.Com a pedalada que levávamos, a noite não poderia acabar assim.Então alguém recordou que o 23 era dia de ir ao mercado, às últimas compras da «festa»: as tangerinas, as cabrinhas, ramos secos, fruta, legumes, hortaliças, pinheirinhos...E se lá fôssemos? Encontro marcado para a porta principal do mercado. Ali chegados, fizemos roda e desdobrámos as canções. Breve estávamos cercados de curiosos e amigos que por ali passavam e connosco fizeram coro. Cantámos para os vendedores, fomos pelos bares circundantes, que nos presenteavam com poncha e petiscos. Foi uma noite bem animada, que a todos encantou.

No ano seguinte lá voltámos. Aos poucos, fomos penetrando no mercado, procurando o melhor espaço. Ocupar o acesso ao piso superior não foi boa ideia. De escadarias ocupadas, durante algum tempo, a clientela foi escassa. Até fomos ameaçados de levar com umas semilhas na tola, eheheh.

Perante a situação, optámos pelas escadas que ligam o mercado à praça do peixe. Enquanto afinávamos, logo a praça e as varandas sobranceiras estavam apinhadas de gente que nos seguia. Encontrámos ali o espaço ideal.

Pedimos som a instituições amigas, cada um de nós imprimia à sua conta, umas dezenas de cópias das letras. A praça afinava connosco, desinibida, entusiasmada, vibrante. Era uma alegria autêntica, genuína, uma Festa! Era um momento de forte pendor natalício. Anualmente, encontro marcado. A imprensa passou a estar atenta à iniciativa, que se tornava sustentável, persistente, confiável, popular. Houve entrevistas, reportagens, transmissões. Até que a Televisão olhou para aquela vivência, que não tinha intenção de espetáculo, apenas de animação duma praça que, pouco a pouco, se transformava num coro monumental, e levou aquela hora de canções natalícias aos lares madeirenses e a toda a diáspora.

Enquanto desempenhei funções autárquicas, fazíamos uma antestreia no mercado de Santa Cruz, e toda a praça, à cunha, nos acompanhava com enorme entusiasmo. Outros mercados começaram a imitar. Hoje, a Noite do Mercado está popularizada, constitui um espaço de magia, bem-adaptado ao cheirinho da festa e às características de cada lugar.

A Noite do Mercado, momento relevante da celebração natalícia, nasceu da iniciativa deste grupo de amigos, que hoje se proclama pomposamente de Confraria dos Cantares, já que quando se reúne há sempre cantoria.

No próximo 23, às 23, na praça do peixe do Mercado dos Lavradores, irá manter-se a tradição!

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