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Artigo de Opinião

JM-Madeira

12/05/2022 08:30

E entre a curiosidade e o medo, e entre a aventura ou a monotonia, descobriu-se o que significava essa vontade de partir e o impacto que teria no que se deixaria para trás.

Ergueu-se então esse nosso antepassado, desafiando a gravidade e derrubando toda a descrença, motivado apenas por alcançar o que até ali sempre tinha sido tomado por impossível.

Foi talvez o germinar da semente da ambição que nos levaria um dia à nossa ruína. Mas como poderia ele o saber naquele momento?

O mundo era então tão imenso e ele tão ínfimo, incapaz de imaginar que o tal sonho que ousou começar a sonhar se expandiria até se tornar maior que o próprio mundo.

O desafio naquela altura era ainda, literalmente, dar um primeiro passo rumo ao horizonte que sempre tinha sido fascínio e desafio.

O limite tinha sido, até então, apenas o que o olhar alcançava mas, ao içar-se daquele plano tão rente ao solo a que sempre se tinha habituado, foi surpreendido por uma nova realidade que fez desmoronar o seu antigo paradigma de realidade. E enquanto os restantes se mantinham inocentemente ignorantes, ele sabia agora que havia mais do que aquilo que a vista anteriormente alcançava.

Sim, o seu mundo tornara-se subitamente maior. Com tudo o que isso acarretava de ambiguidade e curiosidade. Quem poderia dizer se a nova fronteira não seria ela também uma mera questão de perspetiva?

Ruíram inevitavelmente todas as antigas certezas mas estava agora, ao menos, um pouco mais perto das estrelas.

Este era ainda o homem primitivo mas foi com ele que nasceu esta fome insaciável por cada vez mais que, para o bem ou para o mal, faz parte integral de quem nós agora somos.

Mesmo sem certezas, partiu num ato inevitável de coragem e rebeldia. E, ao abandonar desta forma a caverna, tornou-se o arquiteto primordial do nosso futuro.

Eis pois a génese de toda a liberdade, que se prolongou até ao soltar do próprio polegar e ao fim dos seus constrangimentos locomotores.

Tivemos primeiro de ser nómadas por entre todos os cantos do nosso mundo antes de podermos falar de um lar.

Descobrimos algures a morte como demonstração do que significava ter ganho consciência sobre nós próprios e o que nos rodeava.

E apesar disso conseguimos encontrar inspiração para sermos evolução contínua mesmo com regressões pontuais.

Faltou-nos a memória mas nunca o coração para ultrapassar infindáveis tribulações.

Mas pedimos tanto da nossa humanidade por tempo demais, insistimos em ser ímpeto mesmo quando devíamos ser precaução.

Trocamos enfim a nossa mortal existência por uma quimera que nunca se chega a concretizar.

Todas as nossas escolhas foram caminhos que desaguam numa noite de onde não se enxerga mais amanhecer.

Fomos prodígio que gerou a sua própria perdição, fim que se esqueceu do seu princípio.

E já não há mais sequer caverna para aonde voltar.

O berço primordial perdeu-se, tal como se perdeu a memória daquele momento em que o homem ainda primitivo achou que podia ser mais do que aquilo que estava destinado a ser.

Se tudo o que foi por ele sonhado se concretizou, falta então apenas saber se o homem primordial terá sonhado com a extinção da sua própria descendência.

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