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Artigo de Opinião

Advogada

6/07/2023 08:00

A estadia foi conforme a época, sem grandes preocupações com segurança ou, muito menos, conforto. Ficaram amontoados em duas tendas cedidas pelos militares, sobre colchões que partilharam com ácaros, percevejos e todo o tipo de fauna "colchal", eventualmente com a visita duma lagartixa que não se fazia rogada em trespassar a lona.

Ficaram raparigas para um lado e rapazes para o outro, lá está, de novo de acordo com a simplicidade dos tempos, sem problemas de identidade. Os professores dividiam as suas próprias tendas pessoais. O parque de campismo era muito concorrido, mas, o "tudo ao molho e fé em Deus" fazia parte.

Foram à praia, meter os pés na areia, fazer esculturas, nadar, brincar gritar.

Saíram à noite para uns sítios diversão noturna dos quais só subsiste o Pub Zarco em diferente configuração.

Conheceram crianças das suas idades, quiçá um pouco mais velhas com quem trocaram um beijinho, um "alinhanço".

Toda a experiência, desde o "lady of Man", também conhecido como "a mulher do gajo", aos passeios a pé, as lambecas, as refeições na cantina do governo, o cavalo que mordeu a mama duma estudante que insistiu em posar para foto na linha de cruzamento do nariz do dito, ao horror da rapariga a insistir mostrar o bocado de carne mastigada, mesmo a quem não queria ver. Ao que se pirou para o aeroporto para ver aviões e já não queria descer porque alguém achou que gozar (agora chama-se fazer bullying) duma expressão poética e compenetrada que o mesmo fez à beira-mar: _"O mar tem tanta água".

Foram uns dias mesmo muito bem passados, onde todos eram iguais, dormiam uns em cima dos outros, acordavam com a cara fora da tenda, um pé ou um braço, comiam o mesmo, andavam sempre juntos.

No dia do regresso a casa uma comoção levantou-se, sem que tenham percebido muito bem o que se passava. Lá está, como todos juntos, como num arrastão em Copacabana, foram todas as alunas, sim as alunas e apenas essas, chamadas ao "concílio dos deuses", que é como quem diz à beira dos professores responsáveis, liderados pelo temível DT (diretor de turma) a informar que as alunas, note-se, as do sexo feminino, sem espinhas, tinham se portado mal e que mal chegasse a casa, do seu próprio telefone, sem ajudas de custo, e sem custo algum, ligaria às mães, ainda antes de chegarem a casa, o que era perfeitamente exequível porquanto o autocarro circularia pela estrada antiga e o dito DT apearia em Câmara de Lobos, a terra que o viu ser parido.

O regresso transformou-se num momento de pânico, incerteza, medo.

Assim foi, chegadas a casa ainda a última saltava do autocarro já a primeira era espancada pelos pais, a segunda, a terceira também. Espancadas, vítimas duma violência doméstica disfarçada de "educação" pela pancadaria. Apenas as alunas, apenas as mulheres.

Cumpriu o que prometeu o Professor Rui, espero que se consiga identificar e lhe pese na consciência o sofrimento, o verão estragado que provocou a tantas meninas de 14 anos. Espero que se consiga identificar porque, da parte das alunas, reunidas trinta anos depois, já ninguém o soube identificar, nem sequer a disciplina que lecionava, só que era o Diretor da Turma 9ºD da Escola da Lombada da Ponta do Sol. Serviu a reunião para descobrir o porquê dessa atitude medonha, que muitas desconhecíamos e envolvia casos de extrema gravidade, da sua parte, que quis calar pela força da pancada legitimada. Vergonha senhor Professor, vergonha… Faz como eu digo e não como eu faço.

Trinta anos depois estamos aqui e você, onde estará? Ninguém quer saber.

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