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Artigo de Opinião

Antropóloga / Investigadora

9/09/2024 03:50

“Tudo vale a pena, se a alma não é pequena.” Já dizia Fernando Pessoa no seu poema Mar Português. Esta citação aplicava-se bem há uns anos atrás, quando pensávamos em comprar uma casa. Atualmente, quase só vale a pena se a nossa carteira não for pequena. Ora, como a carteira e o crédito do cidadão médio não “esticam” o suficiente para acompanhar os preços do mercado imobiliário, questiono: vale a pena comprar casa nos dias de hoje?

Não é segredo nenhum: um dos grandes problemas que as famílias portuguesas enfrentam atualmente é o acesso à habitação. O colapso do mercado imobiliário é preocupante a vários níveis. E a camada da população mais afetada é justamente a camada da população mais vulnerável, que se encontra no início de carreira ou a construir família, e que não consegue adquirir casa própria, sendo um incentivo adicional à emigração.

Quando era criança, pensava que comprar casa seria um processo simples. Mas à medida que fui crescendo, percebi que não era assim tão fácil. Aliás, ao entrar para a faculdade, quando já sonhava em ter o meu próprio canto, os mais velhos diziam sempre “Primeiro, tens de ter estabilidade. Tens de te formar, arranjar emprego na tua área e ficar efetiva. Só depois poderás comprar a teu cantinho.”

Fiz tal e qual como as ditas normas diziam. Estudei, trabalhei e entrei para o quadro. No entanto, hoje vejo que termos o nosso “canto” não é assim tão simples. Não basta apenas ter um emprego e estar efetivo. Isso era no tempo de Nossa Senhora. Hoje em dia, requer um investimento financeiro avultado, que quase sempre é feito com recurso ao crédito. Para grande parte das famílias, a compra da casa é mesmo o maior investimento que fazem durante a sua vida.

Mas o recurso ao crédito significa que, embora este seja cedido a alguém aparentemente sem risco, como o financiamento é tipicamente feito com taxas variáveis, o mais certo é ter grandes flutuações no valor das prestações a pagar que, na maioria das vezes, ultrapassam os 1200€, valor este maior que o ordenado mínimo em vigor. Já para não esquecer que para ter acesso a este crédito bancário, deverá seguir vários outros critérios, para além de estabilidade no emprego.

Neste sentido, a alternativa é o arrendamento. Aliás, esta tende a ser a opção escolhida por quem não tem acesso ao mercado imobiliário devido a restrições financeiras.

Aqui, o problema altera-se: as casas disponíveis para arrendar são poucas e caras devido à alta procura. No Funchal, em Lisboa ou no Porto, os valores dos arrendamentos ultrapassam o imaginável. Portugal está na moda, para além de ser um destino turístico popular. Mas para quem precisa de comprar ou arrendar casa, este aumento da procura significa que vai ter de pagar mais, ou deslocar-se para a periferia, a menos que haja um aumento do parque habitacional.

Questiono: vale a pena pagar 1200€ ao banco para termos a nossa casa? Ou vale a pena arrendar um T1 pelo mesmo valor? Atualmente, não temos grandes opções. Os apoios do Governo são escassos, se não mesmo nulos. “They don’t care about us.”

Chegámos a um ponto em que temos de fazer malabarismos e acrobacias para conseguir uma certa estabilidade, conforto e segurança. Justo? Deixo a pergunta no ar. Como dizia o autor Pedro Vieira, “Erámos felizes e não sabíamos!”

Alexandra Nepomuceno escreve à segunda-feira, de 4 em 4 semanas.

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