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Artigo de Opinião

Já aqui escrevi sobre a habitação a custos controlados por entender que é uma das ferramentas mais importantes para enfrentar o défice habitacional em Portugal, mas que frequentemente falha em cumprir o seu objetivo principal: proporcionar habitações acessíveis que garantam qualidade de vida aos seus ocupantes. Embora regulamentada por normas que estabelecem exigências mínimas, a realidade é que esses mínimos se tornam o teto máximo da ambição dos projetos (e dos promotores), resultando em espaços desconfortáveis e inadequados às necessidades reais das famílias, transformando o “essencial” em “insuficiente”, ou se me permitirem, criando uma nova realidade, a dos mínimos-máximos.

As empresas promotoras, sob pressão para cumprir os limites financeiros, recorrem frequentemente a cortes que afetam diretamente os futuros moradores. As áreas habitáveis são reduzidas ao mínimo permitido, resultando em divisões pequenas e pouco funcionais; os vãos são igualmente reduzidos, criando ambientes escuros e desconfortáveis; utilizam-se materiais de baixa qualidade para reduzir custos imediatos, ainda que impliquem maior necessidade de manutenção a médio prazo; tomam-se decisões relativamente aos materiais de acabamentos que condicionam fortemente qualquer ação de melhoria futura. Estes problemas são agravados pela rigidez dos concursos públicos, que frequentemente privilegiam o preço mais baixo em detrimento da qualidade arquitetónica e construtiva.

A redução de custos nas áreas erradas gera um paradoxo: enquanto se procura tornar as habitações mais acessíveis, cria-se um produto que pode ser demasiado caro a longo prazo. A falta de durabilidade dos materiais, associada aos problemas funcionais dos espaços, faz com que estas habitações muitas vezes se tornem caras de manter e desconfortáveis para os residentes.

Se contrapusermos este paradoxo à abordagem exposta no livro “Less is enough” de Pier Vittorio Aureli percebemos rapidamente que o “menos” não pode ser entendido como escassez ou como mínimo-máximo mas sim como uma oportunidade de redefinir o que é essencial na arquitetura e na vida urbana. A economia de recursos deve ser aplicada com inteligência priorizando a qualidade e resistindo à lógica mercantil que domina a habitação contemporânea.

Na Região Autónoma da Madeira, os problemas da habitação a custos controlados são agravados pelas condições específicas do mercado local. O custo acrescido de transporte de materiais, associado ao peso crescente do mercado de luxo impulsionado por investidores estrangeiros, torna pouco atrativo para os promotores privados concorrer a projetos públicos neste segmento.

A habitação a custos controlados deve ser mais do que uma solução económica; deve ser uma oportunidade para repensar o paradigma e a circunstância atual da habitação, para criar espaços de qualidade que promovam a inclusão e a coesão social. Para tal, é essencial que as políticas públicas e as práticas privadas deixem de ver os mínimos legais como o objetivo final, passando a encarar a qualidade habitacional como um investimento na dignidade e no bem-estar. Afinal, não se trata apenas de cumprir normas e anunciar percentagens, mas de criar habitações que potenciem uma transformação urbana e que façam a diferença na vida das pessoas.

OPINIÃO EM DESTAQUE
Coordenadora do Centro de Estudos de Bioética – Pólo Madeira
18/12/2025 08:00

Há uma dor estranha, quase impossível de explicar, que nasce quando alguém que amamos continua aqui... mas, aos poucos, deixa de estar. Não há funerais,...

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