MADEIRA Meteorologia

Artigo de Opinião

Professora Universitária

3/02/2025 07:45

Embora a atenção do mundo cultural esteja centrada na dinâmica, por vezes paroxística, do Ministério e do Governo Regional, há que explorar o caminho da autonomia regional e local diferenciada, estabelecendo níveis essenciais de desempenho e de serviços – que devem ser garantidos de forma uniforme em todo o território, isto porque dizem respeito a direitos civis e sociais que devem ser protegidos para todos os cidadãos. Um trabalho a nível da cultura não pode, de facto, reduzir-se a decisões apenas do governo central, nomeações políticas (às vezes, sem a mínima ideia das verdadeiras necessidades da área), sem ter em conta a relação entre a cultura e a vida quotidiana dos cidadãos a nível local.

Num mundo em desordem, com mudanças e ajustes de polos na geopolítica internacional, em que os interesses económicos e estratégicos empresariais dominam as preocupações, como se fossem só eles a condicionar a vida dos cidadãos, o que vale a cultura no plano de desenvolvimento? O receio é que comece a ser vista como parte do pacote que a deriva à extrema direita considera como supérfluo ou até impeditivo de uma maior atenção ao que conta: o crescimento financeiro e o poder político, mesmo que se deteriorem os direitos e valores dos cidadãos. Com a tendência, que se tem vindo, lenta, mas de forma cada vez mais sólida, a afirmar, de alguns partidos sociais e democratas para a agenda dessa direita de contornos extremistas, a cultura será novamente o parente pobre da governação.

Ficará no grupo das coisas pequeninas, que interessam geralmente à esquerda, com pouco efeito na vida quotidiana, e que, pasme-se, na cabeça dos líderes, até levou ao crescimento de coisas terríveis como as políticas de inclusão e de descentralização, dividindo verbas por territórios que contam pouco ou nada em termos do PIB. Ora, como, ao contrário do que certas correntes políticas de matriz extremista nos querem há uma década fazer crer, a cultura é absolutamente necessária para o bem-estar dos cidadãos, há que atuar no levantamento e estabelecimento dos níveis essenciais de desempenho a nível local. Na Região, esse estabelecimento é ainda mais importante quando os investimentos dos municípios são considerados inferiores à média nacional, com exceção do Funchal, e quando continua a existir confusão entre entretenimento ou foguetes e cultura.

Há territórios em que a batalha pela produção cultural é travada por administradores e decisores públicos que nem sempre têm a preparação e competência necessárias para compreender como o seu papel não visa apenas desenvolver a relação entre a administração e os cidadãos, mas também levar a cabo um processo de reconstrução de uma cultura madeirense que se foi dissipando gradualmente entre a globalização e velhos provincianismos. Com duas ilhas habitadas e com uma diferença norte-sul na ilha da Madeira, e, por isso, de periferias na periferia, o papel dos municípios, especialmente os mais pequenos, tem vindo a ser cada vez menos influente neste contexto. E não se trata apenas dos chamados “territórios do interior da Ilha”, mas também das áreas que, em termos de população e extensão, representam cidades de média-pequena dimensão e vilas mais pequenas.

Antes de distribuição de recursos, precisamos de reflexão e orientação. De compreender o que temos de cumprir, a partir dos níveis de desempenho e de valor do impacto cultural – equação realizada na maior parte dos países europeus. O que é necessário é uma conversão de intenções e um debate público que possa novamente construir ações concretas numa visão de desenvolvimento.

Não faltam ferramentas. Também não faltam competências para criar novas ferramentas que possam traduzir esta estratégia em regulamentos, recursos, mecanismos de avaliação e análise de resultados. Também não faltam recursos humanos. Também não faltam vontades. Ou talentos, ou populações que compreendem o valor da cultura no desenvolvimento do seu território e que entendem que esta é geradora de benefícios.

O que falta é uma visão da política que veja o compromisso como um meio necessário para poder dar à Região um caminho de desenvolvimento e não um fim. Porque o fim pode ter muitos andares, mas o que fica subterrado deixa de viver e gerar vida.

OPINIÃO EM DESTAQUE

88.8 RJM Rádio Jornal da Madeira RÁDIO 88.8 RJM MADEIRA

Ligue-se às Redes RJM 88.8FM

Emissão Online

Em direto

Ouvir Agora
INQUÉRITO / SONDAGEM

Quem sai mais prejudicado com a queda do Governo?

Enviar Resultados
RJM PODCASTS

Mais Lidas

Últimas