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Artigo de Opinião

silviamariamata@gmail.com

3/07/2022 08:00

Como não foi possível eu parar de sofrer e deixar que as coisas se compusessem? Eu sabia que "o azeite vem sempre à tona de água". Assim é a verdade! Então? Mas eu não tive a calma nem a maturidade para esperar! E sofria em demasia com aquilo. Até um dia! A acusação alastrou-se! De mim, passou também para meu pai, que já estava reformado e que, entre a ajuda no acompanhamento da doença da minha mãe, passava horas na fazenda a plantar, a regar e a colher o que a terra dava. Agora, éramos os dois ladrões das coisas mais improváveis da tia Elvira: da garrafa de gás, das botas de água de ir ao jardim, do sabão da loiça, da caixa de lume, das meias, do corpete…sei lá! Tudo lhe faltava e tudo estava ali, mas ela não via e acusava. Fora roubada! Isto vezes sem conta! Eu e meu pai éramos os maus da fita!

Ora, um dia, como tantos outros, eu estava no meu jardim! Estava lindo o meu jardim nesse tempo! Devia ser primavera, porque as azáleas estavam em flor. A tia Elvira passou no quintal, atrás da casa, o rosto altivo, ligeirinha como só ela, abriu a porta do caminho e foi para a vereda conversar com a vizinha que também estava lá no jardim dela. E a tia Elvira disse que meu pai lhe tinha roubado a foice. E eu ouvi tudo muito clarinho! A tia Elvira ou estava tonta ou queria pôr-nos a nós todos tontos! Sim, porque meu pai não ia deixar que lhe dessem má fama. Um homem às direitas como ele, com a força dele, com a história dele, antigo como ele, só podia pôr termo àquilo tudo num abrir e fechar de olhos. Sim. E eu fui numa carreira a casa de meu pai, que era ali mesmo a um passo de distância. Meu pai, como sempre, estava a ver televisão mais minha mãe e conversavam. O Marco Paulo cantava a passar o microfone de uma mão para a outra. E estavam os dois entretidos que era um gosto ver! E eu entrei por ali adentro, que aquilo ali não havia ladrões e as portas estavam escancaradas. E era tudo uma paz de alma. Meu pai olhou para mim, com aquela cara de velho lindo como só ele, bateu palmas, feliz por me ver. E eu contei tudo. "A tia Elvira está a dizer que o pai lhe roubou a foice!". E meu pai nem se moveu, nem ficou vermelho de raiva, como acontecera quando eu era pequena e escangalhara mais minha prima o poio de trigo ao senhor Cândido e levara uma malha de correia. Agora, ali, meu pai não se importava! Que diacho! A tia Elvira estava a difamá-lo e ele não se mexia! E foi quando meu pai disse assim:

- Minha filha, o pai não se importa com o que a tia Elvira diga! Quem me conhece sabe muito bem que eu sou um homem da fazenda e que não preciso para nada da merdinha da foice da tia Elvira que só serve para cortar as pontinhas das ervas do terreiro e do bardo!

Foi uma lição. Os velhos de facto são sábios! O tempo sempre mostra quem tem razão. A vida retoma o seu rumo e põe tudo no seu devido lugar!

A tia Elvira, afinal, tinha Alzheimer e ninguém sabia!

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