A Joana tem 5 anos e desabafa a chorar: “Durante a minha atuação a minha mãe estava sempre ao telemóvel, ensaiei tanto e ela não me viu dançar”. Dá um nó na barriga ler isto, não é? Até causa alguma revolta e começamos a julgar esta mãe. Pobre criança, esforçou-se tanto e não se sentiu valorizada neste momento tão importante para ela. Mas, quem nunca? Qual de nós pode atirar a primeira pedra? Provavelmente ninguém.
Infelizmente estes relatos são cada vez mais frequentes. Numa vida de correria, com pais muito ocupados, com dois empregos para sustentar a família, com prazos para cumprir, tarefas domésticas para realizar e eis que chega o temido final do dia. No final do dia para conseguirem fazer o jantar ou organizar a casa, ligam a televisão ou dão o tablet aos miúdos para que estejam quietos, e principalmente em silêncio, durante 20 minutos. Serão 20 minutos? Ou serão 45? Ou mais? Provavelmente nem dão conta do tempo a passar. Entre tachos e panelas, roupas e brinquedos, aqueles supostos 20 minutos, foram a salvação dos pais. A que custo? Será que acarreta mais valias ou dissabores?
Na primeira infância, dos 0 aos 6 anos, as crianças são pequenas esponjas que absorvem toda a informação ao seu redor. Aprendem de forma rápida e imitam com muita facilidade o adulto, pois são a sua figura de referência. Nesta fase crucial do desenvolvimento, devemos ter em consideração o que queremos transmitir às crianças, desde regras, o certo e o errado e até valores. Desengane-se quem acha que as crianças “não percebem” ou “não estão a ouvir” o que os adultos dizem ou fazem, eles estão sempre atentos a todos os nossos passos. Mas para além de estarem atentos também valorizam, e muito, a presença e a atenção dos pais nos momentos importantes para as suas vidas, onde mostram com orgulho as suas conquistas e superações.
Um aparte, ainda se lembram o que é ser criança? Às vezes precisamos de voltar atrás no tempo para conseguirmos entender os mais pequenos, porque ser criança é estar constantemente a aprender, a absorver estímulos, a ter medos e a conhecer o mundo pela primeira vez.
Continuando, se nestes momentos importantes, e nos outros do nosso dia a dia, estivermos ao telemóvel, qual é a mensagem que estamos a passar aos nossos filhos? E quais são as consequências destes atos? Já existem inúmeros estudos relacionados com o impacto dos ecrãs na primeira infância, no desenvolvimento das crianças, assim como nas relações familiares e pessoais.
No estudo do Projeto CHILD (2023), onde foram recolhidos resultados de uma amostra de 3000 crianças, foi identificado que crianças com 3 anos expostas aos ecrãs mais de 2 horas por dia, tiveram um aumento de 25% nos problemas de comportamento até aos 5 anos de idade. Não será isto preocupante?
Para que as nossas crianças não desenvolvam estes problemas, ou outros como sintomatologia ansiosa ou depressiva, aproveite a época que se aproxima e dê atenção ao que realmente importa. Envolva os seus filhos nas tarefas em casa, peça ajuda para pôr a mesa ou fazer o jantar. O jantar vai ser servido mais tarde? Vai, mas é também mais saudável, não só a nível físico como também psicológico, para além de estar a aumentar a autonomia do seu filho, assim como os laços familiares. Façam atividades em conjunto, conversem ao jantar, partilhem experiências do dia a dia em vez de usar o telemóvel como babysitter.
Lembre-se que numa família, os pais são o exemplo dos filhos e quando aplicamos regras, as regras são para todos. Se é proibido usar o telemóvel à mesa, cumpra.
As crianças precisam de amor, atenção, carinho, mas também precisam de ter regras e limites de forma a conseguirem se desenvolver de forma saudável. Nenhuma criança prefere estar ao telemóvel se tiver alguém para brincar. Lembre-se sempre disto.
A vida é mais bonita ao vivo do que atrás de um ecrã. Feliz Natal!