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Artigo de Opinião

6/12/2025 08:00

A sociedade portuguesa, marcada maioritariamente pela moral e os costumes de uma pequena burguesia recatada, sempre se norteou pelos valores da probidade e da tolerância. Não obstante, há uns tempos que perpassam no horizonte sinais preocupantes de atitudes de intolerância e de normalização do desviante. A postura enviesada de alguns homens públicos e a sua sucessiva e temerária exibição, a par da falta de uma instante e severa reprovação social e institucional, vem introduzindo um elemento nocivo de normalização dos comportamentos eticamente censuráveis. Inúmeros exemplos do quotidiano se poderiam aventar.

Quando se tolera que nos debates políticos se utilize linguagem de taberna ou se recorra ao insulto e ao achincalhamento pessoal, extravasando os limites da pluralidade opinativa, está-se claramente a legitimar a sua expressão generalizada e a normalizar o impropério.

Quando a criminalidade de colarinho branco se pavoneia por entre expedientes dilatórios, num orgulhoso sentimento de chico-espertice e a justiça não age atempada e eficazmente, está-se a criar um clima de aparente impunidade e de normalização das tramas ilícitas.

Quando se premeia a incompetência e a sua descabida importância institucional, está-se não só a gerar desincentivo e indignação como igualmente se dá um sinal audaz de que tudo é possível, bastando poder, normalizando o descrédito funcional. Quando a estabilidade e a segurança das instituições se veem trespassadas por sucessivos e escorregadios jogos de cadeiras e alçapões de um chão de ninguém, a confiança dos cidadãos sofre um severo abalo e normaliza-se o desvario institucional.

Quando o pensamento racional e assertivo se vê postergado por manobras de propaganda massiva, secundadas por uma horda seguidista acéfala ou em autocensura, é o espírito crítico e inovador que se paralisa, normalizando em seu lugar a obediência impensante.

Esta normalização contagia o homem comum que, na ausência de exemplos e atitudes nobres e pedagógicas, vai assimilando as condutas eticamente discutíveis como um novo e exemplar paradigma, suscitando a apetência e a liberdade para dar azo aos instintos mais básicos nos seus patamares de atuação. Em lugar de uma veemente repulsa, desperta até nalgumas mentes a admiração pelo charme do malfeitor ou a sua desculpabilização pela asserção leviana de que se lá estivessem porventura fariam o mesmo ou pior.

Ademais, quando se julgava que as convulsões de um passado recente já haviam feito o seu caminho como factos históricos apaziguados, eis que alguém se lembra de ressuscitar clivagens antigas, numa tentativa inconfessada de reescrever a história e minar a paz social. Nesta obsessão por desenterrar estados de espírito conflituosos, vem-se instilando, na quietude e franco acolhimento do povo português, a normalização de um destrambelhado ânimo de intolerância, ódio e desumanidade perante os outros que paulatinamente envenena as relações sociais e a sua atitude diária. Tudo tendo por pano de fundo uma inconsequente ideação messiânica de salvação nacional e de restauração de um putativo patriotismo, que seguramente esconde uma agenda ideológica de retrocesso civilizacional.

Neste novo ambiente de intolerância e normalização do desviante, a que os jovens são mais vulneráveis, revela-se igualmente preocupante a apatia cívica, o jogo silencioso de complacência a que algumas figuras se remetem ou a condenação ardilosa e frouxa de quem nele se revê, mas não lhe dá jeito ou não tem coragem para o assumir.

É tempo de retomar uma cultura de tolerância e sã convivência e refundar os valores da justiça e da probidade no contrato social.

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