O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, pediu hoje que os conflitos mundiais não sejam usados como "desculpa" para fugir às responsabilidades relativas ao clima, defendendo que a humanidade tem de escolher entre "solidariedade ou suicídio em massa".
No seu discurso perante a Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas de 2022 (COP27), Guterres considerou que, apesar dos múltiplos conflitos que assolam o mundo - como a guerra na Ucrânia ou o conflito no Sahel -, "as alterações climáticas têm uma escala e uma linha de tempo diferentes", já que "constituem a questão definidora da época" atual e o "desafio central do século".
Por isso, defendeu ser "inaceitável, escandaloso e contraproducente" deixar a luta contra as alterações climáticas "em segundo plano", até porque "muitos dos conflitos atuais estão relacionados com o crescente caos climático".
Reconhecendo que a invasão russa à Ucrânia expôs a dependência do mundo ocidental face aos combustíveis fósseis e criou uma crise energética no mundo, Guterres pediu que isso não seja usado como "uma desculpa para recuos" nos objetivos definidos relativamente ao clima.
Estes conflitos devem antes "ser uma razão para ter mais urgência, ação mais forte e responsabilidade efetiva", disse.
O secretário-geral da ONU afirmou ainda que, face ao aquecimento global e aos seus cada vez mais rápidos impactos, a humanidade terá de "cooperar ou morrer".
"A humanidade tem uma escolha: cooperar ou morrer. É um Pacto de Solidariedade Climática ou um Pacto de Suicídio Coletivo", disse António Guterres.
A atividade humana é a causa do problema climático, pelo que "a ação humana deve ser a solução", referiu, defendendo que "a confiança" entre "o Norte e o Sul" tem de ser restabelecida.
Guterres pediu que as economias desenvolvidas e emergentes estabeleçam um "pacto de solidariedade climática" para que todos os países "façam um esforço extra para reduzir as emissões nesta década, de acordo com a meta" de limitar o aumento da temperatura a 1,5 graus Celsius e atingir emissões líquidas zero até 2050 em todo o mundo.
"Mas essa meta de 1,5º está ligada à máquina de suporte de vida e a máquina está a tremer. Estamos perigosamente perto do ponto sem retorno", disse, pedindo aos países do G20 (grupo das 19 economias mais desenvolvidas do mundo e União Europeia) que acelerem a sua transição verde "nesta década".
Esse pacto de solidariedade climática também deve garantir que os países ricos e as instituições internacionais "fornecem ajuda técnica e financeira às economias emergentes para que estas acelerem a sua própria transição para as energias renováveis" e "acabem com a dependência de combustíveis fósseis".
Para isso, é preciso "eliminar o carvão nos países da OCDE [Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico] até 2030 e em todos os outros até 2040", afirmou.
O secretário-geral da ONU lembrou aos Estados Unidos e à China, as duas maiores economias do mundo, que têm "uma responsabilidade particular de unir forças para tornar esse pacto uma realidade", sublinhando que o acordo representa a "única esperança para alcançar as metas climáticas".
Lembrando que a população mundial chega oficialmente aos 8 mil milhões de pessoas em 15 de novembro, Guterres avançou uma questão: "O que diremos quando esse bebé 8 mil milhões tiver idade suficiente para nos perguntar: o que fizeram pelo nosso mundo e pelo nosso planeta quando tiveram oportunidade?".
"Não esqueçamos que a guerra contra a natureza é, em si mesma, uma violação maciça dos direitos humanos", acrescentou.
É preciso fazer mais para ajudar os países mais vulneráveis a lidar com as "perdas e danos" já sofridos devido ao aumento das tempestades, inundações, secas e outros fenómenos climáticos extremos, defendeu.
Embora esta questão seja um dos pontos de negociação mais sensíveis desta COP27, "a obtenção de resultados concretos sobre perdas e danos será o teste dos compromissos dos governos para o sucesso" da conferência, considerou.
LUSA