O espetáculo “Amália na América” levou “casa” a centenas de emigrantes portugueses em Nova Iorque, que puderam ouvir e recordar no sábado as mesmas canções populares e o cancioneiro norte-americano que a consagrada fadista cantou e gravou.
Ainda emocionados após duas horas de concerto no mítico Carnegie Hall de Nova Iorque, os fadistas Cristina Branco, Raquel Tavares e Ricardo Ribeiro falaram de um noite “memorável, “muito feliz” e em que os “astros alinharam-se todos”.
“Foi casa. Que não pareça pretensioso, mas poder dizer que o Carnegie Hall foi casa é o maior feito. Poder fazer acontecer este espetáculo, este reportório, com estas pessoas...é um conjunto de fatores que funcionou muito bem. Os astros alinharam-se todos”, disse Raquel Tavares a jornalistas portugueses no final do espetáculo.
“Para este tipo de espetáculo acontecer, da forma que aconteceu, há um fator sorte que é estarmos rodeados das pessoas certas, pelos motivos certos. E acho que viemos todos pelos motivos certos. Orquestra, maestro, meus queridos amigos e colegas. E, portanto, é mesmo uma noite muito feliz”, frisou a artista.
Pelas 20:00 de sábado (hora local, 01:00 em Lisboa), arrancava naquela que é uma das maiores salas do mundo o “Amália na América – Além do Fado”, um tributo a Amália Rodrigues (1920-1999), inserido no encerramento das comemorações dos 40 anos da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD).
Perante uma plateia maioritariamente portuguesa e lusodescendente, que vibrava a cada canção, as vozes de Cristina Branco, Raquel Tavares e Ricardo Ribeiro juntaram-se à Orquestra Sinfónica Portuguesa que, sob a direção do maestro Jan Wierzba, subiu pela primeira vez a um palco norte-americano.
O alinhamento fundiu o fado tradicional com canções da Broadway, que Amália gravou nos Estados Unidos, atravessando vários géneros musicais.
Raquel Tavares cantou temas como “Senhora do Livramento”, “Rosa Branca ao Peito” ou “Tirana”, enquanto Ricardo Ribeiro interpretou, entre outros, “Quando Eu Era Pequenina”, “Ai Mouraria” ou “Solidão”.
Cristina Branco ficou responsável pelo repertório em inglês, cantando, por exemplo, “Summertime”, ”Who Will Buy” ou ”I Can’t Begin to Tell You”.
Mas o momento mais aplaudido da noite ficou para o final, quando os três fadistas se juntaram em palco para cantar “Gaivota”.
“Foi um momento extraordinário poder pisar este palco e esta já ninguém me tira. Acho que a nós já ninguém nos tira. É um privilégio”, afirmou Ricardo Ribeiro, que se emocionou durante a atuação.
“Emocionei-me por duas razões: a primeira é porque eu sou um amaliano convicto. E quando ela canta, há qualquer coisa que...não há palavras para explicar. E depois porque, no fundo, é à conta dela que eu aqui estou. Isso tem um peso enorme no meu coração. [...] Gosto muito dela e ela é uma referência muito profunda”, explicou o artista.
Questionada sobre se Amália teria gostado desta homenagem, Cristina Branco diz não ter dúvidas.
“Tenho a certeza absoluta que ia amar. Acho que é uma homenagem lindíssima”, afirmou a fadista.
“Foi incrível. Foi mesmo muito bonito. Estamos muito satisfeitos. Acho que posso fazer falar pelos três”, acrescentou Cristina Branco.
À saída do espetáculo, o arquiteto João Quinas, de 35 anos, partilhou com a Lusa a sensação de “casa” que experienciou ao ouvir o tributo a Amália Rodrigues.
“Acho que foi uma noite muito importante, sobretudo para os portugueses que estão fora de Portugal. É sempre bom relembrar as nossas origens, a nossa cultura e, sobretudo, a nossa história”, disse o português, admitindo que o espetáculo fê-lo lembrar da família e dos amigos que deixou em Portugal.
Já o presidente da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, Nuno Morais Sarmento, falou em “missão cumprida”.
“Eu acho que é missão cumprida por uma razão: porque ficaram mais algumas pontes - umas novas, outras reforçadas - que são outros tantos caminhos de trabalho para a frente”, avaliou.
Um dos pontos altos da noite foi precisamente quando Nuno Morais Sarmento, instantes antes de o concerto começar, pediu aos portugueses ou lusodescendentes que estivessem no Carnegie Hall para se levantarem.
Questionado sobre o que sentiu, ao ver praticamente toda a plateia de pé, o presidente da FLAD explicou que quis passar uma “mensagem de comunidade, que não é cada um por si, que eles têm a força daquela sala, assim a saibam acariciar e desenvolver”.
O concerto “Amália na América – Além do Fado” é uma produção da Égide – Associação Portuguesa das Artes, coorganizada com a FLAD.
Os arranjos foram criados por cinco proeminentes compositores e orquestradores portugueses: Carlos Azevedo, Daniel Bernardes, Filipe Raposo, Pedro Duarte e Pedro Moreira.
Amália começou a atuar nos Estados Unidos em 1952, no clube noturno La Vie en Rose, em Nova Iorque, cujo cartaz também incluía Edith Piaf e Marlene Dietrich. As atuações de Amália na América tiveram continuidade no Hollywood Bowl, no Lincoln Center, no Carnegie Hall, e na televisão.
Em 1966, foi solista em concertos sinfónicos com as orquestras filarmónicas de Nova Iorque e de Los Angeles, apresentando cantigas tradicionais portuguesas e fados.