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Artigo de Opinião

Msc em Enfermagem Médico-Cirúrgica

30/10/2025 08:00

Vivemos num tempo em que os números parecem explicar tudo: orçamentos, rácios, metas, produtividade. Mas, como sugere Sanne Blauw em “O Poder dos Números”, os números só contam a verdade quando sabemos interpretá-los corretamente. Na área da saúde, essa leitura é particularmente sensível: resumir a realidade dos cuidados a tabelas e quotas, é esquecer que, por detrás de cada número, há uma pessoa, existe uma vida que está em risco.

A Ordem dos Enfermeiros (OE) nunca definiu um número máximo de especialistas por instituição - o legislador usou, e bem, a expressão “não deve ser superior” em vez de “não pode ser superior” – admitindo, deste modo, exceções perfeitamente justificadas quando a segurança dos cuidados assim o exige. O que existe é uma recomendação de natureza orientadora: cada serviço deve dispor de um número de enfermeiros especialistas adequado à complexidade clínica dos doentes que assiste, convertendo, deste modo, as quotas não em limites máximos, mas em valores mínimos de referência. Quando as necessidades assistenciais ultrapassam o mínimo definido, impõe-se, por dever ético e técnico, o reforço das equipas, em vez da sua limitação.

Desde a década de 80 que Linda Aiken e a sua equipa de investigadores provaram, num estudo europeu com de 422 730 doentes, que cada doente adicional por enfermeiro aumentava a probabilidade de morte a 30 dias; inversamente, cada 10% de aumento na proporção de enfermeiros com formação avançada, reduzia-se a probabilidade de morte em 7%.

As conclusões de Aiken e de outros investigadores como Lake, Needleman ou Friese, reforçam que equipas com maior proporção de enfermeiros especialistas registam menos complicações, menor mortalidade, menos eventos adversos e maior satisfação dos doentes e das equipas. A presença de profissionais altamente diferenciados não é um luxo; é uma medida comprovadamente eficaz de segurança clínica e sustentabilidade económica.

É aqui que os números ganham poder efetivo: quando revelam que investir em especialistas não é uma despesa, é uma política de segurança. Os eventos adversos sensíveis à enfermagem como quedas, infeções, úlceras por pressão, erros de medicação, são situações que representam, anualmente, milhões de euros em custos adicionais podem ser evitáveis com a existência de profissionais com a formação e a proficiência adequadas.

Nos serviços que lidam com doentes instáveis e/ou em falência iminente de funções vitais, a presença de enfermeiros especialistas não é apenas desejável, mas imperativa para garantir a segurança clínica e uma resposta atempada à pessoa em situação crítica. Estes profissionais, pela formação que detêm, possuem o raciocínio clínico e a capacidade de decisão rápida necessários para evitar o erro e antecipar a deterioração destes doentes.

Não contratar especialistas significa adiar decisões clínicas adequadas e multiplicar riscos silenciosos. É, em última instância, um custo humano e financeiro que se paga em internamentos prolongados e sobrecarga das equipas.

A sustentabilidade de um sistema de saúde mede-se pela sua capacidade de aprender com a evidência e esta é clara: mais e melhor formação em enfermagem traduz-se em melhores resultados, maior segurança e custos menores.

O SESARAM tem demonstrado o seu compromisso ao dar passos significativos na melhoria contínua da qualidade e no reforço da cultura de segurança, mas é preciso ir além. O desafio reside em interpretar os números à luz da evidência e rever a política de contratação, superando a interpretação rígida das quotas e reconhecendo o valor estratégico dos enfermeiros especialistas para a organização. Porque os números, quando bem lidos, dizem-nos uma coisa simples, mas poderosa: investir em quem cuida é investir em quem vive.

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