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Artigo de Opinião

GATEIRA PARA A DIÁSPORA

11/05/2021 08:01

Em 2019, a Conferência Geral da UNESCO, proclamou o dia 5 de Maio como o Dia Mundial da Língua Portuguesa. Contudo, não se pode subtrair a este importante acontecimento o facto de a história da língua portuguesa ser também uma história de violência que se entrecruza com o colonialismo português. Acredito que a língua portuguesa será ainda mais influente se souber ser veículo para as pessoas, e as ideias, ditas da margem. Em Timor-Leste, a língua – esperemos que mais do que a da administração e a da elite – é também portuguesa. Usamos a resistência na língua como quem a marca na pele. Pela primeira vez, fora do Brasil e de Portugal, começa-se o projecto do Dicionário da Língua Portuguesa de Moçambique. Que a língua portuguesa seja, então, a nossa tabanca e que saibamos dela retirar o que nos dá vida.

O Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo – perto da «Cracolândia» e não muito longe das avenidas Ipiranga e São João, onde só quando Caetano as atravessa alguma coisa acontece no seu coração –, que nos chamuscou a todos aquando do seu incêndio, organizou um evento com artistas funk brasileiros para celebrar a linguagem portuguesa da periferia. É esta mesma língua portuguesa democrática que está de luto, na senda do que um juiz do Supremo Tribunal Federal brasileiro já declarou sobre a mortandade da favela do Jacarezinho: «[…] há indícios de actos que, em tese, poderiam configurar execução arbitrária».

Sérgio Godinho, no rescaldo do 25 de Abril de 1974, editou um álbum intitulado À Queima Roupa, no qual se incluía a canção Liberdade, recordando que «Só há liberdade a sério quando houver / A paz, o pão / habitação / saúde, educação […]». Na véspera do dia da Europa, a Cimeira Social do Porto reforçou esta ideia e assumiu que a globalização e a riqueza gerada devem servir a todos e que há garantias sociais que não se podem negligenciar. Leio que, apesar do modelo social europeu, mais de 90 milhões de europeus –  e uma em cada cinco crianças –  estão em risco de pobreza, e não é difícil perceber que isto faz perigar a Europa, pois ameaça a própria ideia de Europa. A Europa foi feita, dentre outras coisas, para consolidar uma paz periclitante num continente devastado por guerras, mas a paz não é só a ausência de guerra, é também a liberdade – e voltamos à canção de Sérgio Godinho – de viver uma vida condigna. Só cuidando dos Europeus e de quem está sob a sua jurisdição – por exemplo, os emigrantes, os requerentes de asilo – é que se cuida da Europa. É também por isso que é preciso lembrar que também se constrói a Europa na Maloeira, onde se instalaram a Companhia Dançando com a Diferença e Vera Mantero para a sua nova produção; em Odemira, onde prosperidade económica não rima com vida digna; e na Escola do Porto Santo, desenhada pelo arquitecto Raúl Chorão Ramalho  –  onde a comunidade local, e a sua relação com os criadores, é propulsionada para a primeira linha do projecto da Porta 33. Temos é de ser bem claros em relação à Europa que queremos construir.

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