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Artigo de Opinião

Vice-presidente da Câmara Municipal de Santa Cruz

20/09/2023 08:00

E, ainda assim, é uma carta de esperança no futuro, num futuro melhor.

A carta inicia-se precisamente com um desejo e uma incerteza: "Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso. É possível, tudo é possível, que ele seja aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo, onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém de nada haver que não seja simples e natural. Um mundo em que tudo seja permitido, conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer, o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós".

Creio que estas palavras são aquelas que todos nós gostaríamos de escrever aos nossos filhos e sobretudo gostaríamos que essas palavras se fizessem verdade.

Mas sabemos que existem muitas outras palavras e muitas outras realidades que se interpõem entre nós e o nosso desejo de felicidade e liberdade para os nossos filhos. Todos temos a consciência de que o legado e o mundo que estamos a deixar não é perfeito, que as guerras e as atrocidades não ficaram no passado, que a ameaça climática, mesmo para os que teimam em negá-la, é uma realidade que nos interpela todos os dias.

Não, o mundo que vamos deixar aos nossos filhos, e até já o nosso próprio mundo, não é perfeito, não é isento de mácula, não promete a felicidade que queríamos, nem garante o respeito que seria necessário a um mundo inclusivo e até viável do ponto de vista climático.

Tal como escreveu Jorge de Sena em 1959, este é um mundo onde a injustiça, a morte e o sofrimento ainda são impostos a muitos "por serem fiéis a um deus, a um pensamento, a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas à fome irrespondível que lhes roía as entranhas. (...) Às vezes, por serem de uma raça, outras por serem de uma classe, expiaram todos os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência de haver cometido".

Infelizmente, estas palavras sendo poesia não são apenas poema, são uma realidade que ainda persiste num mundo desigual, imperfeito, perigoso e que continua a ser alvo de imorais e irresponsáveis comportamentos.

E, ainda assim, escreveríamos sempre aos nossos filhos as mesmas palavras de Sena: "Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém vale mais do que uma vida ou a alegria de tê-la".

Mas precisamos mais do que desejos e palavras, precisamos de ação para que a carta futura aos nossos filhos termine da mesma forma otimista e esperançosa como termina a Carta de Jorge de Sena: "... o mesmo mundo que criemos nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa que não é só nossa, que nos é cedida para a guardarmos respeitosamente em memória do sangue que nos corre nas veias, da nossa carne que foi outra, do amor que outros não amaram porque lho roubaram".

Ou seja, devemos, aos que já partiram e aos que ainda agora chegaram e começam a viver, esse compromisso de deixarmos um futuro mais feliz do que a história, uma possibilidade mais corajosa do que o medo. Se assim for, poderemos, enfim, escrever a verdade.

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