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Perguntas e respostas: O impasse político em torno do Programa do Governo da Madeira

Data de publicação
03 Julho 2024
16:22

O novo Programa do Governo da Madeira é discutido e votado na quinta-feira, mas sem garantias de aprovação, podendo em caso de chumbo prolongar o impasse político em que a região se encontra desde as eleições de maio.

Seguem-se alguns dados sobre a crise política que começou em janeiro, depois de o presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, ter sido constituído arguido num processo que investiga suspeitas de corrupção no arquipélago. O social-democrata demitiu-se do cargo, levando à realização de eleições antecipadas, em 26 de maio, que voltaram a dar a vitória ao PSD, embora sem maioria absoluta.

Como surgiu a crise que levou às eleições legislativas regionais antecipadas?

No final de janeiro, o presidente do Governo Regional, Miguel Albuquerque, apresentou a demissão depois de ter sido constituído arguido num processo em que são investigadas suspeitas de corrupção na Madeira e que levou à detenção do presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado (PSD), que entretanto renunciou ao cargo, e de dois empresários do ramo da construção civil.

O pedido de demissão foi formalmente aceite em 05 de fevereiro pelo representante da República para a Madeira, Ireneu Barreto, provocando a queda do executivo de coligação PSD/CDS-PP, que entrou em gestão.

Como se desenrolou o processo até às eleições antecipadas de maio?

Após aceitar o pedido de demissão de Albuquerque, o representante da República ouviu os partidos com assento parlamentar na altura (PSD, PS, JPP, Chega, CDS-PP, PCP, IL, PAN e BE). Ireneu Barreto optou, então, por manter o Governo Regional de gestão em funções, até o chefe de Estado decidir se dissolvia a Assembleia Legislativa, o que só poderia ocorrer depois de 24 de março, seis meses após as eleições realizadas em 24 de setembro.

Entretanto, o PSD/Madeira realizou eleições internas, que Miguel Albuquerque voltou a vencer, derrotando Manuel António Correia. O CDS-PP também foi a eleições, passando a ser liderado por José Manuel Rodrigues.

No final de março, o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, recebeu todos os partidos com representação no parlamento da Madeira, que defenderam a realização de eleições antecipadas. Depois de ouvir o Conselho de Estado, o chefe de Estado anunciou a dissolução da Assembleia Legislativa Regional e a convocação de eleições para 26 de maio.

Quais os resultados das legislativas regionais antecipadas de maio?

O PSD/Madeira voltou a vencer as legislativas regionais sem conseguir, pela terceira vez consecutiva, a maioria absoluta, elegendo 19 deputados. O CDS-PP – que, ao contrário do que tinha acontecido nas regionais de setembro, foi a votos sozinho - garantiu dois parlamentares.

Os dois partidos fizeram um acordo parlamentar, sem conseguir, ainda assim, os 24 assentos necessários à maioria absoluta.

O segundo partido mais votado foi novamente o PS, mantendo os 11 lugares. O Chega continuou com quatro deputados e o PAN e a IL mantiveram também os deputados únicos que tinham.

O JPP, partido nascido na região e com origem num movimento autárquico independente, aumentou o número de eleitos de cinco para nove. O BE e o PCP (neste caso, através da coligação CDU, que inclui também o PEV) perderam a representação parlamentar.

Como se processou a indigitação de Miguel Albuquerque para liderar o XV Governo Regional?

Depois das eleições, o representante da República ouviu os sete partidos com representação parlamentar e decidiu indigitar Miguel Albuquerque como presidente do Governo Regional, considerando que teria “todas as condições de ver o seu Programa aprovado na Assembleia Legislativa”.

Sobre a “solução de governo conjunta” que PS e JPP tinham entretanto apresentado, apelando à participação dos restantes partidos, à exceção do PSD e do Chega, “de modo a construir um apoio parlamentar mais robusto”, Ireneu Barreto indicou que não tinha “qualquer hipótese de ter sucesso” no parlamento madeirense.

Por que motivo o Governo Regional retirou a proposta de Programa antes da votação do documento?

O Programa do Governo começou a ser debatido, sob a forma de moção de confiança, em 18 de junho, já sob a ameaça de chumbo, depois de PS, Chega e JPP, que somam 24 deputados dos 47 do hemiciclo (correspondentes a uma maioria absoluta), terem anunciado que iriam votar contra.

No final do segundo dia do debate, o governante anunciou que o executivo iria retirar a proposta, admitindo que não teria condições para ser aprovada no dia seguinte.

Posteriormente, o Governo Regional convidou todos os partidos com assento parlamentar para discutir uma nova versão do documento, mas PS e JPP recusaram participar nas negociações.

Como decorreram as negociações entre o Governo Regional e a oposição para consensualizar um novo Programa?

Após um primeiro encontro que juntou representantes do executivo com CDS-PP, Chega, IL e PAN, os partidos acordaram prosseguir as negociações em reuniões bilaterais.

No final das negociações, a deputada única do PAN, Mónica Freitas (que na anterior legislatura tinha um acordo de incidência parlamentar com o PSD), revelou que o partido está disponível para viabilizar o Programa, mas realçou que o sentido de voto dependerá do documento final. O deputado único da IL, Nuno Morna, anunciou que se irá abster, enquanto o Chega, que continua a colocar a saída de Albuquerque como condição para viabilizar o Programa, remeteu a divulgação da sua posição para a votação.

Na terça-feira, quando entregou o novo documento, o presidente do executivo admitiu não ter “certezas taxativas” da aprovação, mas disse esperar “responsabilidade” por parte da oposição.

O que mudou na segunda versão do Programa do Governo?

O novo Programa do Governo entregue no parlamento regional tem oito capítulos, divididos por 181 páginas, e inclui 19 medidas dos quatro partidos com os quais o executivo regional negociou: Chega, CDS-PP, IL e PAN.

Entre outras medidas, foi integrada a criação de um Gabinete de Transparência, Prevenção e Combate à Corrupção, uma estrutura independente do governo insular sugerida pelo Chega, além de propostas comuns a vários partidos, como a redução fiscal, com a aplicação do diferencial de 30% defendido por vários partidos.

Por indicação do PAN, por exemplo, foi incluída a revisão do Estatuto do Provedor do Animal e, por indicação da IL, está prevista a criação de um portal da transparência. O CDS propôs, entre outros, a fixação na concertação social de um salário base regional para os jovens licenciados.

O que acontece se o novo Programa do Governo for chumbado?

A nova versão do Programa do XV Governo Regional, que tomou posse em 06 de junho, será discutida e votada na quinta-feira sob a forma de moção de confiança. Caso o documento seja chumbado pela maioria dos 47 deputados do parlamento, o executivo de Miguel Albuquerque não entra em efetividade de funções e permanece em gestão.

O Estatuto Político-Administrativo da Madeira é omisso sobre as consequências da reprovação de uma moção de confiança e, apesar de entre as causas da demissão do Governo Regional não constar a reprovação do documento, poderá prevalecer o que a Constituição da República Portuguesa estabelece no artigo 195.º, relativo à demissão do executivo: segundo a alínea e) do artigo, “a não aprovação de uma moção de confiança” é um dos motivos que levam à demissão do Governo.

Nesse cenário, o representante da República para a região voltaria a ouvir os partidos com representação parlamentar para tentar encontrar uma solução de governo viável. Se não fosse possível a formação de um novo governo, o executivo continuaria em gestão até que decorra o período constitucional, de seis meses, para serem convocadas novas eleições. Ou seja, contando com esse período e os prazos para a convocação de novo sufrágio, só seria possível a realização de novas eleições antecipadas na Madeira a partir do final de janeiro.

Contudo, Ireneu Barreto já revelou ter um entendimento diferente, considerando que nunca poderá retirar consequências políticas da não aprovação do Programa, já que o executivo “assenta exclusivamente” na Assembleia Legislativa e só este órgão o poderá demitir.

Por isso, para ultrapassar um eventual chumbo, o representante defende que “todos os responsáveis políticos” devem colocar “o acento tónico da sua ação no interesse superior da região” para que o documento seja aprovado e o arquipélago possa ter “um Orçamento que traga estabilidade”. Até lá, o executivo continuará em gestão.

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