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Artigo de Opinião

Professora Universitária

29/04/2024 07:35

Numa sociedade democrática, a educação é substancialmente formação para a democracia, isto é, o objetivo é formar cidadãos capazes de compreender o mundo, de definir em conjunto o que se entende por bem comum e de desenvolver uma maior solidariedade entre os homens e povos. É por isso que a educação é responsabilidade da coletividade tendo em visto o futuro, o devir. Pais, professores e funcionários, associações, responsáveis pela comunicação, artistas, em suma, quase todos os membros da sociedade estão envolvidos no processo educativo, porque numa sociedade democrática o projeto educativo é um esforço que diz respeito a todos e todos são chamados a dar o seu contributo.

Muitos são os estudiosos que têm vindo a ligar a crise da democracia que se tem vindo a sentir no mundo ocidental à educação. John Dewey escreveu em 1916 um interessante texto intitulado “Democracia e Educação” em que defende que a educação não pode ser reduzida à aprendizagem de conceitos e técnicas, a uma espécie de instituição escolástica, mas deve elevar-se à função de estrela guia da ação quotidiana. No fundo, deve ter o sentido pró-activo de laboratório da concretização de um modo de vida democrático baseado no respeito dos direitos humanos e na consciência cívica. É por isso que a educação deve ser acessível a todos, de forma o mais igualitária possível, oferendo a todos as mesmas oportunidades de realizar as suas aspirações.

Nos últimos anos, o discurso da educação tem vindo a centrar-se principalmente nas necessidades expressas pelos docentes no sentido de valorização das carreiras e da melhor gestão das escolas. É justo. Mas, também precisamos falar dos alunos e de como lhes permitir uma educação global, atendendo a uma sociedade em constante transformação social e tecnológica, baseada na formação e não apenas na instrução. A educação que, no pós 25 de abril, teve a grande virtude de possibilitar o acesso a todos a um bem que é um direito humano, está hoje a sofrer da valorização do currículo técnico, especializado e utilitarista em desfavor da formação humanista dos estudantes. E isto verifica-se em todos os graus de ensino, não considerando os desafios da inteligência artificial e do constante desenvolvimento do digital, mas também do tumulto ideológico, do niilismo, da subjetivização da moral, da perda de valores. Não nos podemos esquecer também da mercantilização do ensino, de cunho liberal, que oferece a educação como produto e vê o aluno como cliente. Uma mercantilização que favorece os que mais têm num processo elitista que marca a sociedade: os que mais possibilidades têm em aceder a um maior leque de ofertas são também os que ocupam mais facilmente os lugares de poder e decisão.

Além da necessidade de compreender o aluno numa dimensão fora dos rankings, dependentes em grande parte da situação socioeconómica das famílias e da localização das escolas em territórios menos ou mais favorecidos, há que favorecer a relação do aluno com a ação cívica e com a dimensão de responsabilidade ética. Para isso, o processo educativo não pode repetir estratégias cristalizadas ao longo de anos e fazer reformas sobre reformas nos currículos e nos sistemas de avaliação que não passam de boas intenções, tratando os alunos como experiências para depois se concluir que há novamente de se fazer de novo o mesmo.

Se se continuar a não perceber que a educação deve ser entendida como direito primeiro do estudante no processo formativo da democracia, a democracia ruirá por dentro. É, por isso, que se deve ir para lá do uso dos tablets, conseguir transformar a educação em demanda, em provir, numa militância humanista. Não vão ser a valorização da carreira e o aumento da formação a salvar a crise na educação- apesar de justas -, porque não são o milagre e panaceia para todos os males. Há é que fazer o que se apregoa e não se realiza – dar ao aluno modos de atuação que lhe permitam decidir por continuar a viver num sistema democrático, sendo sujeito de transformação e não de involução, atraído por discursos mediáticos. Para isso, é necessária uma sólida formação humanista e uma preparação histórica, artística, literária, antropológica que permita aos alunos ver mais e ter maior consciência da responsabilidade e protagonismo individual e social.

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