MADEIRA Meteorologia

Artigo de Opinião

Investigadora

27/10/2024 07:30

Estava previsto um grande temporal. Canoas em terra, viagens marítimas alteradas, jogos recalendarizados. Um pequeno alvoroço. Eu, pelo sim, pelo não, estendi as pernas no areal à espera destas tempestades que agora têm nome de gente. O Rui Leão, que é entendido nestas coisas, disse-me:

- Vou pescar, e saiu com as suas barbatanas, o óculo, a arma e a boia de sinalização. Nem levou fato. O mar estava baboso e morno.

Fiquei a ler, gozando uma praia só para mim. Só me lembrava de Seu Mateus, brasileiro de berço, mas angolano de coração que, aos 80 anos, cantava com o violão “O meu sal ninguém explica”.

O Rui regressou carregado de salemas, tainhas e alguns bodiões. Debaixo do braço, trazia ainda uma garrafa de Rosé, acabadinha de pescar, disse ele a rir, explicando que a tinha “pescado” lá para os lados do porto de Abrigo, justificando que deveria ter caído de algum iate. Ainda aguardo pela patuscada, mas já provei Cavala da Índia, a iguaria de que todos falavam. Está aprovada, sim senhora. Esta vida é mesmo muito arrastada, como diz o meu amigo Henrique Levy.

Tradicionalmente, o feriado do 5 de Outubro é animado por estas bandas e apesar da celebração ter calhado num Sábado, sentiu-se o extraordinário movimento de banhistas. Correndo o risco de me repetir, dediquei-me à apreciação destes forasteiros e, por entre os que correm de imediato para a água assim que chegam à praia, há os que colocam um oleado para proteger as toalhas e as bolsas da areia. Juro que me apeteceu dizer que melhor seria terem ficado num qualquer calhau da ilha vizinha. Aliás. foi por causa destas lagartixas que os Nadadores-Salvadores dos Balneários tiveram que vedar o recinto pois a concorrência para se estender no cimento era elevada. Mas, o ponto alto deste animado fim de semana foi um casal, já avançado na idade, que me surpreendeu ao tirar da mochila um pano de swifer para tirar a areia do corpo. Primeiro ele, como bom marido, tirou a areia de todos os cantos e depois, ela, que pacientemente esperou que ele terminasse a sua limpeza para iniciar a dela. Corri para o mar, não evitando as gargalhadas. O ser humano é de facto um ser engenhoso, mas primeiro eles e só depois elas!

E porque hoje já falei de um amigo que abre as portas da casa da lancha e me acolhe sempre de braços abertos, vou aproveitar o mote e vou apresentar-vos o Valter, cuja alegria logo pela manhã contagia tudo e todos. Ora varrendo as ruas, ora regando os pequenos jardins da cidade, de sorriso largo e sempre bem-disposto, cumprimenta amigos, conhecidos e até os de fora, aproveitando para promover esta ilha que o viu nascer. É um relações-públicas nato. Consciente da singularidade deste chão de ouro e formosura, Valter tem agora a responsabilidade acrescida de hastear as bandeiras à sexta-feira. Nem imaginam a postura e o enlevo com que o faz e, sobretudo, a sua preocupação para não se enganar na ordem de colocação. Uma vez terminada a delicada tarefa, afasta-se e fica a observá-las, vendo-as a esvoaçar, visivelmente satisfeito. Só então, é hora de ir embora e gozar o fim de semana. Cada vez que o vejo, recordo os versos de Torga:

És a graça da vida em toda a parte,

Ou em arte,

Ou em simples verdade.

OPINIÃO EM DESTAQUE
Coordenadora do Centro de Estudos de Bioética – Pólo Madeira
18/12/2025 08:00

Há uma dor estranha, quase impossível de explicar, que nasce quando alguém que amamos continua aqui... mas, aos poucos, deixa de estar. Não há funerais,...

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