Mais de 100.000 crianças na região de Tigray, no norte da Etiópia, vão sofrer de desnutrição aguda grave no próximo ano, dez vezes o habitual, devido ao conflito que se arrasta desde novembro, anunciaram hoje as Nações Unidas.
A estimativa foi anunciada pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), numa conferência de imprensa em Genebra.
"À medida que a UNICEF chega a áreas de Tigray que eram inacessíveis nos últimos meses devido à insegurança, confirmam-se os nossos piores receios acerca da saúde e bem-estar das crianças nesta região conturbada do norte da Etiópia", afirmou a porta-voz da agência da ONU, Marixie Mercado, após regressar de uma missão ao país africano, noticia a agência Efe.
A UNICEF mostrou-se também preocupada com a atual situação de mulheres grávidas e lactantes, sendo que quase metade delas sofrem de desnutrição aguda, podendo levar a complicações na gravidez e ao aumento do risco de morte materna e o nascimento de bebés com baixo peso.
"O que tenho visto é uma confluência de condições que põem em risco a vida das crianças. Em muitos lugares não há fornecimento de alimentos terapêuticos necessários para tratar a desnutrição, não há antibióticos, e as instalações de saúde não têm eletricidade. Além disso, as crianças não foram vacinadas durante meses", acrescentou a porta-voz.
A fome continua a alastrar-se no norte da Etiópia, uma vez que as regiões vizinhas de Tigray, Afar e Amhara, foram também atacadas devido à expansão do conflito, tendo muitas culturas sido destruídas e lojas de alimentos pilhadas.
A ONU pediu o acesso sem restrições à região, em particular para o transporte de combustíveis, dinheiro, equipamento de telecomunicações e materiais necessários para transações financeiras.
"A resposta é posta em causa pela interrupção dos serviços de comunicações e por falhas de energia generalizadas. O acesso humanitário é o maior desafio", referiu o porta-voz da Gabinete das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, na sigla em inglês), Jens Laerke.
Segundo a OCHA, para fazer face à deterioração da situação alimentar na Etiópia, são necessários 500 camiões com ajuda na capital regional, Mekele, todas as semanas, mas apenas 50 conseguiram alcançar a capital desde o final de junho.
Até agora, a circulação de pessoal e material só tem sido possível através de uma rota na região de Afar, o que requer a passagem por muitos postos de controlo, onde os trabalhadores de ajuda humanitária são interrogados, intimidados ou detidos.
Laerke assinalou que as operações em Tigray são "extremamente perigosas" e que 12 trabalhadores já morreram no conflito.
A OCHA reconheceu que a declaração de um cessar-fogo em 28 de junho melhorou o acesso a Tigray, mas sublinhou que este continua a ser "extremamente difícil".
Em 01 de junho, o Programa Alimentar Mundial da ONU advertiu que um total de 5,2 milhões de pessoas, mais de 90% da população de Tigray, necessita de assistência alimentar de forma urgente devido ao conflito.
O primeiro-ministro etíope, Abiy Ahmed, Prémio Nobel da Paz em 2019, lançou uma intervenção militar em 04 de novembro para derrubar a TPLF, o partido eleito e no poder no estado.
O Exército federal etíope foi apoiado por forças da Eritreia. Depois de vários dias, Abiy Ahmed declarou vitória em 28 de novembro, com a captura da capital regional, Mekele, frente à TPLF, partido que controlou a Etiópia durante quase 30 anos.
No entanto, os combates continuaram e as forças eritreias são acusadas de conduzirem vários massacres e crimes sexuais.
Em 28 de junho, Adis Abeba anunciou um cessar-fogo unilateral, aceite, em princípio, pelas forças de Tigray.
Lusa