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Artigo de Opinião

Recupero este mês o tema de um texto que escrevi neste espaço em setembro de 2023, abordando a questão da desconformidade das licenças de utilização nos processos de compra e venda de imóveis. Recentemente, houve uma mudança significativa no cenário da transação imobiliária em Portugal, com a introdução do Decreto-lei 10/2024, que aboliu a exigência da licença de utilização para esses fins. Hoje, após este novo decreto-lei é ainda mais urgente debater e compreender esta problemática.

Esta medida tem suscitado diversas preocupações, especialmente em relação às construções antigas, dispensadas da licença de utilização caso não tenham sofrido intervenções desde 1951 (data em que entrou em vigor o RGEU). Contudo, é razoável questionar a veracidade dessa condição, considerando a diminuta probabilidade de não terem sido realizadas obras ao longo dos anos em edificações com mais de 70 anos de idade, a título de exemplo.

Se aceitar licenças de utilização que não refletem a realidade podem resultar em sérios prejuízos para os futuros proprietários, que podem adquirir imóveis com deficiências construtivas desconhecidas, não exigir a apresentação da licença, ao abrigo do Decreto-lei 10/2024, é ainda mais arriscado e imprudente.

Nestes moldes o estado aceita ser conivente na transmissão de imóveis em situações de ilegalidade construtiva. Pergunto então para que servem os processos de licenciamento ou de legalização? Nestes moldes surreais, qualquer imóvel, licenciado ou não, bem construído ou não, cumpridor ou não das diversas legislações construtivas, pode ser vendido sem qualquer comprovativo. E se não é necessária a licença é porque se considera que o licenciamento e a legalização não são necessários, pergunto: em caso de acidente grave com algum destes imóveis, resultante de má construção ou de mau projeto (quando exista) quem é responsabilizado nestes casos? Não tem o potencial comprador o direito de saber da situação de ilegalidade de um imóvel?

Retomo aquilo que já afirmei em setembro de 2023, uma alternativa viável para evitar a perpetuação da ilegalidade na transação imobiliária seria a exigência de emissão de uma certidão de conformidade entre a licença de utilização original e a situação atual da edificação. Isso garantiria que todas as propriedades transacionadas estivessem em conformidade com as normas em vigor na época da licença de utilização e caso não estivessem deveriam ser alvo de legalização.

Embora se entenda a necessidade do estado de dinamizar o mercado imobiliário para resolver um problema que já tem décadas e do qual é o principal culpado, não tem qualquer sentido que a desejada dinamização se faça através da perpetuação de situações de ilegalidade urbanística com a conivência do estado. É como procurar resolver um problema criando outro muito maior.

O estado não pode passar a responsabilidade da fiscalização da situação de um imóvel para os potenciais compradores. Os mais astutos saberão inteirar-se do histórico do imóvel, enquanto os menos atentos só irão descobrir a prenda envenenada muito tempo depois, quando porventura receberem uma notificação camarária para a legalização de obras ilegais.

É urgente repensar os procedimentos existentes para criar a tão desejada dinâmica imobiliária, mas garantindo que os imóveis transacionados estejam em conformidade com as leis e regulamentos, protegendo assim os interesses dos compradores.

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