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Artigo de Opinião

Bispo Emérito do Funchal

21/04/2024 08:00

Quando após a quarta classe entrei no Seminário da Encarnação do Funchal, encontrei uma casa cheia de 120 alunos, de teologia, filosofia e curso liceal.

Nem todos queriam ser padres, mas por falta de escolas nos campos, não era possível estudar senão nesta casa para depois frequentar a Universidade em Lisboa. Todos os professores eram eclesiásticos, alguns formados em Roma, somente dois eram leigos, um capitão que nos dava ginástica e matemática e o outro o Senhor Engenheiro Luiz Peter Clode, professor de inglês. O Reitor admoestava-nos a ter o maior respeito por eles.

A família Clode, distinguia-se pela grande cultura que trouxera à Madeira entre elas o Conservatório-Escola Professional das Artes da Madeira. Um dos Clodes era Médico e também músico, fundara a Juventude Antoniana em Santo António, realizando também peças de teatro, tendo cantado a minha primeira missa em Santo António. Tomaram como Padroeira Santa Teresinha do Menino Jesus. Sua filha, a professora Teresa, ensinava na escola do Boliqueime, e enquanto eu conduzia um grupo masculino de 60 jovens da Joc, que cantavam a missa dominical na Capela dos Irmãos de São João de Deus, a Teresa Clode tinha um outro grupo feminino de 60, e dirigia o Posto Emissor da Rádio.

Era uma incansável mulher duma caridade inesgotável, num tempo de grande entusiasmo e dinamismo em que as crianças eram educadas nas escolas públicas por gente crente, aberta e combativa, formadas no espírito militante da Ação Católica. A diocese teve o privilégio e o dom de ter as crianças das escolas confiadas a gente de fé viva, alimentada pela eucaristia e confissão das primeiras sextas-feiras do mês.

No dia 2 de abril deste ano, li no quotidiano JM, que a família, tinha celebrado o 120º aniversário, do nascimento do pai, a Isabel pediu-me, para escrever duas linhas sobre seu pai, o que faço com muito prazer, por até reconhecer nele um homem da Eucaristia, que frequentava a Catedral quase todos os dias.

Para mim, o Senhor Engenheiro Clode está completamente ligado com o Museu de Arte Sacra e as obras de arte religiosa da Madeira, no tempo histórico do Vigário-Geral, Cónego Camacho e Padre Pita Ferreira.

A minha estadia em Roma, juntamente com o Padre Maurílio e Padre Abel Augusto da Silva levaram-nos a visitar quase todos os Museus de Roma e Itália e a assistir aos ótimos concertos e até operas na cidade Santa de Roma, este desejo de ver, estudar e conhecer, como diz Dostoievsky “a Beleza salvará o mundo.” As Peregrinações e Migrações, com milhares de madeirenses por todo mundo, fazem parte do desejo de levar a cultura chegar a todos.

Quando cheguei ao Funchal como Bispo, li num jornal da África do Sul que o magnífico Museu de pintura flamenga do Funchal estava mal cuidado. Não era verdade, mas tomei a decisão para que não o fosse no futuro. Numa audiência com o Senhor Engenheiro Peter Clode, ele entregou-me uma pintura do Rei Dom Sebastião que não sendo Arte Sacra, estava num quarto de visitas no Museu e tinha várias pessoas que o queriam emprestado, para evitar atritos trazia-o para o Paço Episcopal. Falou-me da dificuldade de reparar algumas obras por falta de dinheiro, pedia também para deixar o cargo devido à idade e ser substituído. Aconselhou-me sua filha a doutora Luísa Clode. Passado algum tempo nomeei-a após ter falado com o Vigário-Geral que tinha diversos problemas urgentes na Igreja do Colégio.

Os primeiros quadros seguiram para restauro em Lisboa, depois vieram os peritos para o Museu e Colégio. Com a Doutora Luísa fizemos diversas exposições que foram publicadas em livros, procurámos recuperar obras que tinham sido levadas dum conjunto do Colégio, um do Museu. Colecionador trouxe para o Paço obras ilícitas, enchendo uma sala de entrada.

Durante a minha longa vida de Bispo residencial não mudei de diretora do Museu. Apenas um pormenor, apareceu num leilão em Lisboa um fragmento de uma escultura flamenga proveniente do continente. A Doutora Luísa, que estava em Lisboa, telefonou-me dizendo se queria comprá-lo, respondi-lhe sem o ter visto. “Se gosta, compre-o”.

Sabia que devia ser conveniente enriquecer o Museu com mais uma obra.

Outra vez foi com o Senhor Cónego Velosa que tinha no Altar Mor da igreja do Colégio um São João dum tríptico, não conseguíamos encontrar um exemplo digno para aquela belíssima igreja dos jesuítas. Passando por Lisboa, por ocasião de uma Expo, encontrei o São João Evangelista em madeira, na medida apropriada. Diz-me o vendedor do norte de Portugal, que já havia um compromisso com a Espanha.

Disse-lhe que se havia um comprador em Portugal ela não deveria sair par o estrangeiro, tanto mais que a Espanha era rica de estátuas mais do que Portugal.

Telefonei ao Senhor Cónego Velosa dizendo que custava 40.000 euros, mas era a ideal para o Colégio. Ao entrar dentro do Colégio pergunto sempre pela bela estátua que não deixei mudar de nacionalidade!

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