Há perspetivas variadas sobre este assunto, mas certamente que uma das explicações envolve o ambiente de polarização em que vivemos e que, entre outros, se caracteriza pela lógica de "nós contra eles" e pela incapacidade de ouvir ou sequer de ter interesse em ouvir a outra parte. Em suma, a ausência da ideia do terreno comum ou common ground, em que, apesar das diferenças, há pressupostos e valores partilhados, que tornam possível o diálogo e o confronto democrático. Não é por acaso que muitos eleitores do partido Republicano não gostam de Trump, mas ainda gostam menos dos Democratas - em especial se a agenda destes e que ocupa o espaço mediático não for a das questões que realmente preocupam as pessoas.
O clima de polarização e tribalismo está a marcar múltiplas dimensões da vida, desde a forma como são apresentadas notícias até às discussões sobre questões sociais, e envolve rejeitar algo que seja diferente, quer na aparência, quer nas ideias ou na própria identidade. E isso tem sido bem patente nos últimos tempos.
Há muito que a Psicologia estuda os fenómenos de ingroup vs outgroup, mostrando como a simples pertença a um grupo, por oposição a outro, pode ter efeitos notáveis na perceção da realidade e na tomada de decisões. Num ambiente social e político de crescimento de extremismos, de hiperativação, de ciclos noticiosos de 24h, de redes sociais, de notícias falsas, em cima de problemas de desigualdade e complexas questões sociais e geopolíticas, aqueles efeitos não são variáveis de experiências de laboratório, e são agora mais agudizados e quotidianos.
É a este propósito que foi significativa a mensagem de todos, todos, todos do Papa Francisco, na recente Jornada Mundial da Juventude. (Aliás, a própria realização da JMJ foi comentada por alguns nesta perspetiva de polarização, num espetro entre comentários que não concordavam com aquele evento apenas por ser de natureza católica, e outros que percebiam qualquer comentário de desacordo como anti-clericalismo.). Como líder da Igreja Católica, ao enfatizar que ali existe lugar para todos, o Papa Francisco trouxe uma mensagem verdadeiramente cristã, de valorização da diversidade e da inclusão, o que, por vários motivos - incluindo face ao risco de agendas extremistas que afetam as instituições -, constituiu um aspeto de grande valor.
Uma piada já com algum tempo diz que "aceito todos sem exceção, mas desde que sejam brancos, heterossexuais e católicos" (ou protestantes, conforme a versão). Ao defender a ideia de todos, todos, todos, e sobretudo ao concretizar o que isso significa, o Papa Francisco veio uma vez mais lembrar que o humanismo, a inclusão e o respeito pela dignidade e a identidade de cada um continuam a ser - e mais do que nunca é importante lembrar - valores civilizacionais centrais, incluindo do Cristianismo. Uma mensagem que deve ser ouvida também por todos, todos, todos.