Desde logo, qual é o enfoque que adotamos na abordagem a este tema. Se a saúde mental, como refere a Organização Mundial da Saúde, corresponde a "um estado de bem-estar que permite às pessoas realizar as suas capacidades e potencial, lidar com o stress normal do dia a dia, trabalhar produtivamente e contribuir ativamente para a sua comunidade", então intervir neste domínio requer uma amplitude maior, centrada no bem-estar psicológico e não apenas na doença. A evidente necessidade de garantir as melhores condições de tratamento e recuperação psicossocial das pessoas com perturbações não pode, por isso, menorizar a necessidade de se prevenir o surgimento dos problemas e promover as competências que permitam às pessoas lidar com os desafios que enfrentam nas suas vidas. Isto leva-nos à segunda ideia.
Para que existam contextos de vida mais saudáveis e que previnam os problemas, e para promover competências, são determinantes, para além da Saúde, setores como a Educação, o Trabalho, o Social, o Ambiente, a Justiça, entre outros. Trata-se de concretizar uma abordagem global da saúde mental e do bem estar em todas as políticas, sabendo quais as medidas que impedem que as pessoas adoeçam e, portanto, responder às questões: Como é que o desenho e a implementação das políticas contempla e favorece o bem-estar das pessoas e da comunidade? Em que medida isso se integra numa estratégia ampla e integrada?
Em termos operacionais, é uma abordagem que não se limita a transpor um modelo clínico centrado na doença para contextos de normalidade, mas uma abordagem sistémica e multinível, com medidas que se apliquem de forma universal (por exemplo, a promoção de competências sociais, da literacia em saúde psicológica e do autocuidado), medidas seletivas dirigidas a determinados grupos e medidas intensivas e mais micro, focadas no indivíduo, conforme as necessidades.
Por fim, não podemos deixar de referir que o sucesso das políticas neste campo, à semelhança do que ocorre em qualquer outro, decorre da mobilização da evidência disponível para desenhar e implementar as melhores intervenções, bem como da existência de quadros de referência para as avaliar. Como referimos noutras ocasiões, há muito conhecimento disponível que pode ser utilizado e que deve informar as intervenções, evitando-se informalismos que não contribuem para resultados nem para a otimização e potenciação dos recursos. Saber se uma medida ou intervenção teve o resultado desejado é também essencial para a possibilidade de a replicar ou melhorar, mas também de diferenciar a sua qualidade. Isto é especialmente relevante numa realidade em que proliferam ofertas de intervenções e "terapias", as quais não se baseiam na evidência, não são levadas a cabo por profissionais vinculados a um código deontológico e podem agudizar situações de risco ou de fragilidade, tendo na prática o resultado oposto ao que se propõem ter. Começam logo por ser as políticas públicas que devem evitar isso mesmo.