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Artigo de Opinião

Economista

14/08/2021 08:00

O Presidente dos EUA, Joe Biden, designou o dia simbólico de 11 de setembro de 2021 para a retirada total das forças americanas de solo afegão. Nos 20 anos que durou a sua presença militar e civil, mais de 2300 soldados americanos morreram nas operações contra os talibãs. O custo humano para o estado democrático afegão foi ainda maior - 45,000 forças de segurança e civis do Afeganistão morreram somente durante o último mandato de cinco anos do Presidente Ghani. O custo total estimado da operação militar e de desenvolvimento ultrapassa os $822 mil milhões.

Hoje, as capitais de província caiem que nem peças de dominó perante o assalto dos talibãs. A ONU afirma que a ofensiva dos talibãs provocou até ao momento 3,3 milhões de deslocados no país, e prevê que o país pode registar o pior número anual de vítimas civis num conflito armado. 80% dos deslocados desde maio são mulheres e crianças. Não tarda que a pressão migratória se faça também sentir na Europa, devido à sua fuga da violência e opressão do regime talibã.

É desolador que depois de duas décadas onde, com maior ou menos sucesso se tentou instaurar um sistema livre e democrático, agora assistimos às reportagens das tomadas das cidades afegãs pelos talibans. Chamou-me a atenção, as declarações de um apoiante dos talibãs, que afirmava perante as câmaras que as mulheres não estavam a ser obrigadas a usar a burka - "foram pregadas a tal". Ou seja, tenta vender ao ocidente uma ideia espúria de que a submissão feminina é voluntária e bem-vinda. Sob o jugo do poder da violência, voluntarismo é somente um sinal de sobrevivência.

A saída dos EUA do Afeganistão e com eles, a dos restantes aliados, veio expor as fragilidades de uma construção democrática pouco solidificada e repleta de falhas. Os talibãs rapidamente ganharam terreno, simplesmente saindo da sombra a que estavam proscritos. Mas na verdade, as suas recentes conquistas militares é que puxaram o resto do país para dentro das sombras.

Uma busca rápida na internet mostra-nos fotografias de Cabul dos anos 1970 na internet. Vemos mulheres a passear com vestidos ocidentais, livres e seguras. É verdade que a Cabul de há uns dias atrás não era ainda sequer essa cidade dos anos 1970. Mas o que está no horizonte é ainda pior do que o estado atual. É a prova de que os retrocessos civilizacionais são maiores certezas que os seus progressos, e que por isso não podemos dar como garantido que o mundo só pula e avança.

Também nas nossas sociedades os ponteiros do relógio do desenvolvimento podem retroceder, também podem ter sombras. No dia em que baixarmos a guarda, é o dia em que alguém aproveita o espaço vazio para destruir os alicerces do desenvolvimento e do humanismo.


Sugestão da Semana: Na plataforma Netflix pode encontrar a série sueca "Califado" que aborda o fundamentalismo islâmico no Daesh, entretanto fragmentado. Demonstra a vida difícil das mulheres e o abuso de violência. Hoje, o Daesh encontra-se mais limitado mas os recentes acontecimento no Afeganistão mostram-nos que só porque um incêndio perde intensidade, não significa que não possa deflagrar noutro ponto do globo.

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