O cansaço do capricórnio
Eu sou capricórnio. Como tal, diz-se, sou autoconfiante, independente, determinada, persistente, responsável, íntegra, honesta, prudente, reservada, realista, prática e tenho os pés bem assentes no chão.
Tenho bom senso e os meus objetivos bem traçados. Estou sempre preparada para o pior. Supostamente, com todas as características que me atribuem, deveria ter uma grande segurança derivada das certezas que carrego.
Mas, na verdade, dou por mim dominada por incertezas. Cada vez mais incertezas. Não sei se aquilo que sempre tive por certo está certo, se aquilo que sempre tive por melhor é o melhor, se o caminho que sempre me pareceu o correto é o correto.
Não sei se as verdades que fui acumulando ao longo da vida são verdade, nem sei se a verdade em si é razoável, sensata ou, sequer, aconselhável.
Não tenho conselhos a distribuir a torto e a direito, a todos os que os pedem e aos outros também não. Não tenho opiniões sobre todos os assuntos que vão surgindo, por mais relevantes ou insignificantes que sejam. Querem verdades? Eis uma verdade: eu nada sei. Como eu já nada sei, aquilo que penso vale pouco.
Dizem os especialistas que tenho um espírito do tipo Benjamin Button, o homem que nasceu velho e que ao longo da vida se foi tornando cada vez mais jovem, até chegar a bebé. O meu espírito nasceu velho e maduro, mas com o passar do tempo foi rejuvenescendo e aprendendo a viver com menos seriedade.
Talvez por isso, por o meu espírito estar a fazer o percurso inverso do habitual, tenha a estranha sensação de cada vez saber menos e menos e menos, apesar de estar continuamente a aprender mais e mais e mais. Ou será que não estou?!
Das inúmeras certezas que pensava ter vindo a reunir na vida, passei para a grande certeza de nada saber. Dou por mim agora com a convicção (se é que dá para ainda ter este tipo de certeza inabalável) de que não tenho mais nada a dizer. Por isso estou cansada de falar, cansada de escrever, cansada de pensar.
Este cansaço deriva do meu espírito que nasceu já velho e cansado. Como o Poeta, tenho “Uma vontade de sono no corpo/Um desejo de não pensar na alma/E por cima de tudo uma transparência lúcida/Do entendimento retrospetivo…/E a luxúria única de não ter já esperanças?/Sou inteligente; eis tudo./Tenho visto muito e entendido muito o que tenho visto,/E há um certo prazer até no cansaço que isto nos dá,/Que afinal a cabeça sempre serve para qualquer coisa.”
Eu sou capricórnio. Sou pessimista, irredutível, inflexível, controladora, melancólica, desconfiada. Tenho um acentuado autodomínio, uma vontade indomável, mas também exerço sobre mim uma forte auto-repressão. Planeei desde cedo cada pormenor da minha vida, o caminho que vou trilhar. E tudo isto me dá agora um enorme cansaço. No entanto, este cansaço que me toma não toma o meu sentir.